10 ANOS DA INSURREIÇÃO DE JUNHO DE 2013

10 ANOS DA INSURREIÇÃO DE JUNHO DE 2013

Comunicado Nacional da FOB

Há 10 anos atrás o país foi sacudido por uma jornada de lutas que teve seu pico entre os dias 17 e 20 de junho. Trabalhadoras e trabalhadores, principalmente, a juventude proletária marginal se mobilizou por todo o país de norte a sul, de leste a oeste. Das maiores cidades as cidades pequenas do interior do país. Foi o maior levante proletário do país com manifestações simultâneas em centenas de cidades brasileiras. Uma verdadeira insurreição popular.

O fato é que se havia um processo de aumento do consumo produzido pelas políticas dos governos petistas, nas condições sociais não haviam mudanças estruturais. As condições de trabalho não melhoravam substancialmente, apesar do aumento real do salário mínimo, e as condições de vida nas cidades se degradavam cada vez mais, com os serviços públicos de saúde e educação em péssimas condições, assim como o ataque aos povos do campo para construção de grandes obras com as hidrelétricas do madeira, Jirau e Santo Antônio, e do Xingu. Sem contar o avanço da fronteira agrícola pelas áreas de terras públicas e dos povos indígenas, quilombolas e camponeses.  Nos centros urbanos, a população carcerária, de maioria negra, só aumentava e o assassinato de jovens negros também continuava muito alto.

Greve Selvagem de 2011 em Jirau

Em 2011, começou a ter um aumento do número de greves. Já no início do ano explode uma greve selvagem nos canteiros de obras da construção da hidrelétrica de Jirau, no Rio madeira. Operários insatisfeitos com as condições de trabalho e à revelia das direções sindicais promoveram um quebra-quebra e uma greve, que voltou a se repetir em 2012. Nesse ano, explode uma greve dos trabalhadores e trabalhadoras e estudantes da rede federal insatisfeitos com as péssimas condições de estudo e trabalho feito pelo programa REUNI de expansão das universidades. No mesmo ano é realizada a COP+20 que teve intensa mobilização dos povos originários e do campo, com ocupação do prédio do BNDES. Esse ano teve um grande número de greves, o maior desde 1997, época das lutas contra a privatização da Vale do Rio de Doce e da Telebrás. O movimento sindical e social estava acomodado pela política de conciliação de classe do PT e da CUT desde 2002.

Essa conciliação tinha como local estratégico o favorecimento do principal sub-grupo operário dirigente da CUT: os metalúrgicos do ABC. A política pública pró-montadoras de venda de carro flex foi desenhada também para favorecer o setor sucroalcooleiro do agronegócio e logicamente uma pequena parcela dos trabalhadores. Isso fez com que aumentasse o número de carros na rua, sem que houvesse melhoria nos transportes urbanos e investimento em barcas e trens de passageiros, tanto metropolitano como de um estado para outro. Muito pelo contrário. Então havia uma combinação de piora das condições de transporte público, com aumento de horas nos ônibus e trens, e aumento desse transporte. Os aluguéis aumentaram, com as remoções mais os trabalhadores pobres eram empurrados para a periferia das cidades. Em 2012, a crítica da população ao sistema de saúde e educação eram cada vez maiores, com parte da população recorrendo aos serviços privados, como tentativa de melhorar esse acesso. Nesse período do governo Lula e Dilma o número de estudantes em escolas privadas aumenta, enquanto diminua na escola pública. O mesmo acontecia com os planos de saúde. Na educação superior aumentou ainda mais o número de estudantes em universidades privadas.

Por sua vez, as obras dos megaeventos (Copa do Mundo, Jornada Mundial da Juventude e Olimpíadas) levaram em torno de 260 mil pessoas perdessem suas moradias, desalojadas para realização de obras para esses megaeventos. Mas não só o povo foi expropriado da sua moradia, também foi expulso do futebol e dos estádios. Ela foi uma expulsão real e simbólica. No caso do futebol o aumento do preço dos ingressos e a higienização dos estádios. Dessa maneira, o PT e seus aliados arrancaram material e simbolicamente o futebol e sua seleção do povo, algo que nem a ditadura empresarial militar conseguiu fazer em pleno AI-5, por exemplo.

A narrativa do PT e PCdoB, CUT e CTB e todas as forças governistas era de que os governos de esquerda estavam num caminho de desenvolvimento autônomo, progressista, justamente porque promoveria o progresso econômico-social. Contudo, o que aconteceu foi o aumento da integração ao imperialismo internacional, através do neoextrativismo, e no caso do Brasil, pela retomada de um sonho nacionalista e subimperialista, no qual o país seria o Brasil Potência com suas próprias multinacionais (as grandes construtoras, empresas de energia e do agronegócio). Isso era evidente nos discursos, cerimônias e nos comerciais as vésperas da copa das confederações. Por outro lado, isso criava um aumento de expectativa de melhora da condição de vida em grande parte das trabalhadoras e trabalhadores.

A Luta pelo Transporte Público: “Pare o Aumento!”

A luta pela redução de tarifas e melhoria do transporte pública é antiga no país. No Rio de Janeiro em 1870 teve a revolta do vintém contra o aumento das passagens. Nas últimas décadas o movimento pela redução das tarifas, passe livre e tarifa zero se intensificou em várias cidades. Na década de 2000, estudantes da Universidade Federal Fluminense (UFF) capitaneados pelo Diretório Acadêmico de Ciências Sociais criaram o Comitê de Luta Contra a Máfia dos Transportes que impediu por 6 anos o aumento das barcas e denunciava o esquema de transporte nas barcas e na cidade de Niterói. Em Salvador-BA teve a Revolta do Buzu em 2003; Florianópolis-SC a Revolta da Catraca em 2004, no Rio de Janeiro-RJ a Revolta contra o Fim do Passe Livre em 2007; e em Natal-RN a Revolta do Busão em 2012.

Porto Alegre – RS

A luta pela redução das passagens e pelo passe livre é uma luta histórica dos estudantes e outras camadas da classe trabalhadora brasileira. É uma luta contra o ultra monopólio dos transportes e suas máfias enredadas nos poderes municipais. As revoltas da primeira metade da década de 2000 geraram o Movimento Passe Livre (MPL), tendo mais força em São Paulo. As juventudes e movimentos estudantis sempre se organizavam para encaminhar essas lutas.

Diante de todo o contexto nacional em 2013 também se iniciam em várias cidades do país lutas pelo passe livre e pela redução das tarifas. Antes de junho, Goiás e Porto Alegre, como o Bloco de Lutas, já haviam conseguido organizar suas manifestações e diminuir as passagens. Essas lutam passaram animar a luta em outras cidades. No Rio de Janeiro era o Fórum de Lutas Contra o Aumento das Passagens, realizado sempre no IFCS-UFRJ, região central da cidade do Rio de Janeiro, que se organizava o movimento de luta contra o aumento das tarifas em consonância com movimento de outras cidades, principalmente São Paulo.

A Insurreição de Junho. Da Luta contra as Tarifas a Críticas aos Megaeventos e a Violência Policial

As manifestações de Junho de 2013 começaram com um ato nacional, convocado para o dia 06 de Junho, especialmente por organizações estudantis de diferentes tipos. Quatro cidades participaram das manifestações: Natal, Porto Alegre São Paulo e Rio de Janeiro. Elas se repetem as segundas e quintas, nos dias 10 e 13, quando as manifestações são sempre reprimidas violentamente e em São Paulo é duramente atacada. Antes da manifestação marcada para o dia 17 de junho, segunda feira, acontece a abertura da Copa das Confederações no Rio de Janeiro, onde uma manifestação completamente pacífica é duramente reprimida pela Polícia. Vai ser então nos atos de 17 e 20 de junho que a insurreição se alastra e o tema dos transportes se combina contra os megaeventos e contra a violência policial. E na outra semana, nos dias 24 e 27 de junho, já em menor número, e depois do anúncio da redução das tarifas, o tema foi a crítica dos megaeventos e a crítica da violência policial, que se generalizou sob a palavra de ordem “não acabou, tem que acabar, eu quero o fim da polícia militar”, aumentado com o caso do pedreiro Amarildo, no Rio de Janeiro e se transformando numa bandeira das manifestações. É nesse momento que grupos como Mídia Ninja, Coletivos de Mídia-ativistas, grupos anarquistas e diversos grupos auto organizados ganharam destaque e importância.

Além desses atos e manifestações, a partir do movimento estudantil cresceram os espaços organizativos como fóruns e assembleias, chegando uma no Rio de Janeiro a ter mais de 2000 pessoas na praça em frente ao IFCS_UFRJ. A multiplicidade de bandeiras e o engajamento de diversos jovens e seus grupos era evidente. A partir de então a palavra de Ordem “Não Vai Ter Copa” passou a unificar as reivindicações contra os gastos públicos com megaeventos e a reivindicação de expansão dos gastos públicos com saúde, educação e necessidades básicas da população. Bem como a luta contra a violência policial. Mas também, o surgimento da palavra de ordem “sem partido” evidenciou a crise da democracia representativa burguesa e crise e fim da República Cidadã de 1988

            As jornadas de junho de 2013 representaram uma crise da relação entre direção e base, com muita auto-organização, temporária é verdade, que questionaram o monopólio de representação e o poder de decisão das organizações com o Estado. E nesse turbilhão havia diferentes matizes ideológicos. O grito de “sem partido” assustou partidos, sindicatos e movimentos sociais que mesmo diante de um clamor por uma greve geral para 01 de julho, foram contrários a este, com dirigentes cutistas negando qualquer possibilidade de isso acontecer e convocaram uma Manifestação para o dia 11 de julho.         A partir de então, tivemos nas ruas de um lado: 1) os partidos, sindicatos e movimentos hegemônicos e de outro lado: 2) organizações que negaram o monopólio da representação para apostar na ação direta e nos conflitos nas ruas (grupos de advogados, médicos, grupos de autodefesa que depois se tornariam os Black Bloc, blocos de oposição dentro de assembleias e plenárias). Esse contra-poder, essa contra-organização, negou as organizações existentes e com sua fluidez organizacional mante-se na rua, combatendo as burocracias partidárias e sindicais que saíram em defesa da ordem burguesa. Sendo a atual Federação, a FOB, um dos frutos permanentes das Jornadas de Junho.

Vítórias e Legados

É preciso destacar que as jornadas de junho conseguiram uma redução coordenada do preço da tarifa dos transportes coletivos, e mais recentemente a implantação de tarifa zera em várias cidades. E conseguiu inclusive que várias propostas do governo Dilma, paralisadas no congresso, avançassem rapidamente, como reconheceu a própria ex-presidente, como o projeto de lei que garantia o uso dos royalties do petróleo para o financiamento público da educação e saúde. Foi o contra poder que emparedou o Estado.

            Podemos destacar que o legado imediato de junho de 2003 foram: 1) a combinação do movimento “Não vai ter Copa” com as Greves de Massa, como as dos trabalhadores da educação e dos Garis do Rio de Janeiro (2013-2014).; 2) a ocupação das escolas secundaristas, em 2015-2016, que começou em São Paulo e se espalhou pelo Brasil; 3) em 2017, as manifestações nacionais em Brasília contra a Reforma da Previdência (especialmente o 28 de Abril e o 24 de Maio), que levaram o governo federal a convocar o exército para tentar conter os protestos violentos no DF; 4) e, em 2018, a greve de massas dos caminhoneiros, que interrompeu a circulação de mercadorias, gerou uma crise de abastecimento. Todas elas colocaram em evidência a política de insurreição e greve de massas. A toda essa potência proletária o Estado e os Capitalistas responderam com tirania e tentativa de cercear essas experiências com terror.

Greves das Trabalhadoras da Educação Rio – Outubro de 2013
Greve dos Garis do Rio – Carnaval de 2014

            Por fim, o legado de junho também é uma experiência coletiva de aprendizado para as organizações revolucionárias. A revolta a multiplicidade de experiências auto organizacionais se dissolverem, muito pela violência do Estado, perseguição judicial como o caso dos 23 do RJ e prisão de Rafael Braga, mas também pela ausência de organicidade entre aqueles milhares de manifestantes, ativistas que pudessem dar um salto auto organizativo. Por isso é preciso um trabalho mais permanente de organização nos locais de estudo, moradia e trabalho, criando laços de solidariedade. Construindo a ação direta.

            A FOB é uma dessas experiências que permaneceram e humildemente tentar contribuir para o fortalecimento do sindicalismo revolucionário no país e a construção da revolução social de forma fraterna com outro coletivos e organizações.

Brasília-DF
Tomada da ALERJ – RJ
Repressão RJ
São Paulo
São Paulo
Rio de Janeiro
Fortaleza – Ceará

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