DECLARAÇÃO FINAL DO III ENOPES

DECLARAÇÃO FINAL DO III ENOPES

Nos dias 13, 14 e 15 de dezembro de 2024, as organizações filiadas à Federação das Organizações Sindicalistas Revolucionárias do Brasil (FOB) se reuniram por meio de delegados eleitos na base representando mais de 150 filiados, além dos 12 Comitês Sindicalistas Revolucionários (CSR).

As delegações discutiram as contribuições enviadas por todo o Brasil ao III Encontro Nacional de Organizações Populares, Estudantis e Sindicalistas Revolucionárias (ENOPES). O tema do Encontro foi “Fortalecer a Organicidade na Massificação do Sindicalismo Revolucionário”, partindo do balanço das táticas organizativas experienciadas nos últimos anos, desde a transformação do Fórum de Oposições pela Base em uma Federação, visando avançar na teoria e práticas da FOB e se aprofundar no sindicalismo revolucionário.

Nesse sentido, identificamos que o terceiro governo Lula está marcado por uma conjuntura diferente daquela do início dos anos 2000 em que havia um boom internacional das commodities e não havia uma oposição conservadora tão consolidada. Hoje há menos margem para programas sociais, mesmo aqueles anteriormente já limitados enquanto políticas de assistência focalizadas (e não universais), e um ajuste fiscal mais draconiano, aprofundado com o Novo Arcabouço Fiscal (um repaginado Teto de Gastos do Temer) e o recente pacote de cortes sociais que ataca o BPC e o salário mínimo, além da não revogação de medidas como reforma trabalhista, previdenciária, do ensino médio, etc.

Tal manutenção indica que o governo de Frente Ampla Lula-Alckmin (PT-PSB) opta voluntariamente por se aliar e não combater a elite econômica e a crescente extrema-direita, sob a ilusão de manter a governabilidade, o que têm guiado a agenda política do Brasil para o aprofundamento da crise social, aumento da violência, carestia de vida, precarização das condições de trabalho, retirada de direitos e precarização das condições de estudo. A isso se alia um exacerbado individualismo que o neoliberalismo vem impondo à sociedade, isolando e fragmentando os trabalhadores em supostas soluções pessoais, como o empreendedorismo. Nesse contexto, forças religiosas conservadoras com base na teologia da prosperidade e da espada tem expandido suas ações entre a classe trabalhadora.

No plano internacional, presenciamos o avanço da extrema-direita global, a escalada dos conflitos com a conflagração das guerras entre Rússia e Ucrânia e a ofensiva da guerra de extermínio de Israel contra a Palestina. Os conflitos internacionais são fomentados pelo bloco imperialista hegemônico, EUA e países da União Europeia, bem como pelo bloco imperialista emergente, liderado por China e Rússia – que apesar de desafiarem o poder norte americano, não são “antimperialistas” como equivocadamente caracterizado por organizações reformistas. Em meios a esses conflitos internacionais, com interesses globais e regionais se entrelaçando, como no oriente medido, destaca-se uma experiência revolucionária autóctone importante: a Revolução de Rojava. A Revolução de Rojava, por meio do confederalismo democrático, se desenvolve hoje no norte da Síria e enfrenta o jihadismo global, a Turquia e a pressão por reivindicação de um Estado Curdo.

Tais potências e suas guerras impõem uma procura acelerada por recursos naturais e energéticos, o que tende a expandir as contradições e exploração social e ambiental na América Latina e no mundo nos próximos anos.

As ondas de insurreição popular, progressismo e ascensão de governos de extrema direita na América Latina nos permite identificar uma dinâmica geopolítica regional em que:

1) as duas ondas insurrecionais (1989-2006 e 2013-2019) atestam que os povos e a classe trabalhadora da América Latina recorreram, e ainda podem recorrer, a métodos pró-revolucionários de mobilização de massas para lutar contra o ajuste neoliberal e reivindicar melhor condição de vida;

2) a mobilização popular pode se estender por meses, como no caso chileno, e desencadear a substituição contínua de presidentes, como no caso argentino, mas

3) mesmo atingindo alto nível de mobilização popular, esta não tem conseguido se transmutar em organização popular de massas capaz de manter a mobilização popular e dobrar as forças políticas, jurídicas, militares e ideológicas dos Estados aos interesses do proletariado.

4) a força coletiva do povo acumulada durante o período de mobilização popular, sobretudo urbana, tem sido cooptada para a regeneração da ordem estatista e capitalista, com exceções em levantes no campo em que se estabelece uma libertação territorial localizada, como os zapatistas no México e Mapuches no Chile.

5) mais cedo ou mais tarde ou o progressismo adere ao ajuste ultraneoliberal ou é golpeado pelo imperialismo, criando as condições para mais uma onda insurrecional que acaba por ser cooptada para mais uma regeneração da ordem, contudo, dessa vez, na forma de ascensão da extrema-direita ao governo, como o Brasil de Bolsonaro (2018-2022), ou para mais uma reedição de experiência progressista, como o Chile de Boric (2021).

Neste cenário de falsa polarização política, onde nem Lulismo nem Bolsonarismo representam uma alternativa ao modelo neoliberal, onde as burocracias sindicais, estudantis e populares condenam qualquer mobilização como pró-bolsonarismo e por vezes atuam como linha auxiliar da extrema-direita, o desafio colocado é a necessidade de enraizamento do sindicalismo revolucionário nas lutas comunitárias, sindicais e estudantis. Apesar do reformismo, as lutas sociais têm voltado lentamente ao cenário nacional, ainda isoladas e limitadas ao corporativismo e legalismo, porém sinalizando que é possível sair da defensiva passiva que a classe trabalhadora passou desde 2017. A pauta da redução da jornada de trabalho por meio da campanha contra a escala 6 x 1 deixou ainda mais claro o papel do petismo e seus aliados: impedir o ascenso de uma luta ativa da classe trabalhadora. O contexto, portanto, exige não apenas trabalho de base, agitação e propaganda, mas entusiasmo e compromisso militante.

O problema da expressão de massas não é exclusividade da FOB, mas de todo o polo revolucionário, como corrente minoritária tanto na população quanto nos movimentos sociais em geral. Contudo, os avanços dados pela Organização Popular Terra Liberta e pelo Movimento Autônomo Popular, ao expressarem uma diferença qualitativa de organização do campesinato e do proletariado marginal, apontam o caminho: o foco deve ser as campanhas reivindicativas e autorrealizadas para resolver e melhorar as condições imediatas de vida do povo.

Considerando que cerca de 91% da classe trabalhadora hoje não é sindicalizada, permanece o desafio de organizar a luta sindical em setores desprotegidos por organizações coletiva e mais vulneráveis a exploração, um trabalho embrionário e quase invisível. Nos setores de maior mobilização e tradição sindical, se faz necessário intervir no interior dos sindicatos reconhecidos pelas categorias, não nos limitando a práticas de oposição burocrática que luta apenas para ganhar o aparato das diretorias, mas sobretudo promovendo autênticos movimentos de base, combativos, independentes da diretoria e em aliança e solidariedade com outros segmentos, como terceirizados e estudantes.

A atuação sindicalista revolucionária deve partir das condições materiais de vida do povo, das suas reivindicações imediatas por direitos, trabalho, renda e terra. Partindo das reivindicações imediatas e das experiências de organização e luta coletiva, avançando para acumular forçar e expandir o horizonte do mundo novo que estamos criando.

No decorrer do III ENOPES, deliberou-se sobre rearranjos internos que visam melhorar a organicidade da Federação e sua capacidade de atuar como corpo coeso. Como parte desse processo, foi aprovado, por exemplo:

  1. A Filiação Internacional: A adesão da FOB à Confederação Internacional do Trabalho (CIT), fortalecendo laços com outras organizações sindicalistas revolucionárias ao redor do mundo. A CIT e a Federação Obreira Regional Argentina (FORA) enviaram mensagens de saudação e apoio ao III ENOPES, além de observadores que participaram do encontro, reforçando a solidariedade internacionalista.
  2. Mudança de Nome: A Federação passou a se chamar “Federação das Organizações de Base”, mantendo “Sindicalismo Revolucionário” em nossa logo, refletindo seu compromisso em articular as lutas populares, estudantis e sindicais a partir de uma perspectiva mais abrangente e enraizada nas bases.
  3. Novo Conceito Organizacional: A adoção do conceito de “Organização Comunitária” para o que antes era concebido como “Organização Popular”. Essa nova abordagem prioriza a organização por local de moradia, com centralidade na questão fundiária e agrária, reafirmando a luta pela terra como eixo estruturante.
  4. Critérios para Delegados: Foi estabelecido que o ENOPES e a Plenária Nacional serão compostos por delegados eleitos nas bases, viabilizando a participação no processo de crescimento nacional da Federação. Cabe destacar que ficou estabelecido a frequência do ENOPES de 5 a 8 anos.

Além disso, o espaço possibilitou o aprofundamento da discussão sobre luta emancipatória da população LGBTQIA+. As análises apresentadas permitiram identificar que na atual conjuntura duas perspectivas falaciosas sobre a questão LGBTQIA+ emergem: o reducionismo de classe e a ideologia liberal no campo LBGTQIA+. O Reducionismo de Classe é a perspectiva reacionária que limita o que é a classe trabalhadora evocando uma imagem que não questiona o patriarcado como essencial para a manutenção do sistema capitalista e age de acordo a reforçar a “Normalidade” imposta pelo Estado, formando uma visão da classe trabalhadora que reduz e limita a sua real composição. A partir dessa visão, qualquer manifestação de luta que extrapole a questão do trabalho, ou seja, aborde fatores étnico-raciais, de gênero, orientação sexual, anticapacitista, etc, não é digno de discussão, vendo-os como “identitarismo” ou apenas uma preocupação futura.

Por outro lado, a ideologia liberal no campo LGBTQIA+ trabalha a partir da exclusão da questão de classe da luta LGBTQIA+, em uma tentativa não de abolir o sistema capitalista, mas de reformá-lo. A ideologia liberal no campo LGBTQIA+ demonstra sua incapacidade de resolver os problemas da população ao fomentar práticas eleitoreiras, conquistas individuais de espaços de poder e consumo, representações midiáticas, etc. Ambas visões devem ser combatidas pelos sindicalistas revolucionários.

As resoluções do III Enopes reafirmam o compromisso da FOB em aprofundar suas bases teóricas e práticas, fortalecer sua estrutura organizativa e ampliar sua atuação em defesa da classe trabalhadora e dos setores oprimidos. Em tempos de crise e retrocessos, a resistência organizada, a solidariedade internacionalista e a luta por transformações radicais são mais necessárias do que nunca.

Viva o III ENOPES!

É FOB! É FOB! Criar um povo forte!

Viva a Federação das Organizações de Base!

Por um sindicalismo revolucionário e autônomo!

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