[SVR-RJ] Desde o início do atual Governo, há somente seis meses, são registrados inúmeros ataques e retrocessos na área socioambiental. Isso não surpreende de fato, tendo em vista o discurso e as propostas de Bolsonaro ao longo de sua campanha política, incluindo a intenção de extinguir o Ministério do Meio Ambiente – MMA e consequentemente atacar as trabalhadoras e trabalhadores do setor que vem resistido a seguidos governos e aos projetos de extração mineral e agropecuário, como foi no caso de Belo Monte e das hidroelétricas do Rio Madeira. Principalmente por medo de perder mercado internacional, o Governo Bolsonaro mudou de estratégia e resolveu esvaziar as atribuições do MMA, retirando funções, poder político e autonomia, ou seja, resolveu arruinar a política ambiental sem ter o ônus de extinguir o MMA e seus órgão vinculados.
Com a decisão de manutenção do MMA, a escolha do nome para a pauta deveria ser condizente com as propostas para enfraquecimento da área sociambiental. A nomeação de Ricardo Salles como Ministro do Meio Ambiente, corrobora esta intenção: Salles foi condenado em 1a instância por improbidade administrativa por favorecimento às empresas de mineração e filiadas à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) ao alterar mapas de zoneamento do plano de manejo da Área de Proteção Ambiental (APA) do Rio Tietê (APAVRT) quando era secretário de Meio Ambiente de São Paulo.
Desde então a área sociambiental vem sofrendo inúmeros prejuízos. O MMA foi reformulado, perdendo a competência de combate ao desmatamento, de programas para populações indígenas, de combate às queimadas e à desertificação, o departamento de educação ambiental, a responsabilidade socioambiental. Secretarias, como a Secretaria de Mudança do Clima e Florestas, foram extintas, o Serviço Florestal Brasileiro, assim como a coordenação do Cadastro Ambiental Rural (CAR), passaram para competência do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa); a Agência Nacional de Águas – ANA para o Ministério do Desenvolvimento Regional.
Até maio deste ano, a liberação de agrotóxicos aumentou significativamente, atingindo recorde desde o início da divulgação destes dados. Foram aprovados 169 produtos, em apenas 3 meses, sendo 48% de alta ou extrema toxixidade e 25% são proibidos na União Européia. Tornando mais grave esta situação, tramita na Câmara o Projeto de Lei n0 6299/02, conhecido como o “PL do Veneno”, de autoria do ruralista Blairo Maggi, um dos maiores produtores de soja do mundo, dono da Amaggi, gigante do agronegócio brasileiro que controla todos os elos da cadeia da agricultura industrial: insumos, produção, escoamento, processamento, transporte e exportação. O Presidente Jair Bolsonaro já deu declarações de apoio ao “PL do veneno”, da mesma forma que a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, quando estava no comando da Frente Parlamentar da Agropecuária liderou o rolo compressor da bancada ruralista na aprovação deste pacote, e já no cargo de Ministra, disse à imprensa que a pauta sobre alteração das regras para os agrotóxicos terá “muito espaço em sua gestão no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abasteciemento (Mapa)”. O “PL do Veneno” flexibiliza as regras uso de agrotóxicos no Brasil e reduz drasticamente as atribuições do Ibama e da Anvisa no processo de licenciamento desses produtos, conferindo plenos poderes ao Ministério da Agricultura para autorizar a comercialização de agrotóxicos. O Brasil já é registrado como um dos maiores consumidores de agrotóxicos do mundo. Os efeitos podem ser devastadores, incluindo contaminação de alimentos, do solo, da água e do ar, riscos para a saúde, incluindo câncer e mal de Parkinson, além do risco de extinção de espécies. Uma pesquisa da Fiocruz informou que cada brasileiro consome por ano, em média, 7,3 litros de agrotóxicos. Isto significa, entre outras consequências, mais casos de câncer e puberdade precoce. Sem falar nas mortes advindas deste consumo. A ONU mostra que 200 mil pessoas morrem por ano por consequências dos agrotóxicos. Enquanto muitos países criam restrições para o uso destes produtos, o Brasil vem facilitando seus licenciamentos e comercialização. Todavia, como regra no Governo Bolsonaro, a Ministra Teresa Cristina disse conhecer a pesquisa da Fiocruz, e que “discordava totalmente da sua metodologia, números e conclusões”. A quem interessa a liberação de agrotóxicos? A quem interessa a flexibilização das regras para uso destes produtos?
A Flexibilização do Licenciamento Ambiental é outra proposta defendida pelo Governo Bolsonaro. Logo que assumiu o Governo, Bolsonaro criou uma secretaria de apoio ao licenciamento ambiental vinculada à Secretaria de Governo da Presidência da República, passando atribuições que antes competiam a servidores concursados a indicados políticos, como: instruir processos de licenciamento ambiental, receber e analisar a documentação ambiental, propor aprimoramentos técnicos e normativos para os processos de licenciamento ambiental dos empreendimentos qualificados no Programa de Parcerias de Investimentos – PPI (Decreto nº 9.669/2019).
Outra iniciativa para flexibilização do licenciamento são os inúmeros projetos de lei tramitando no Congresso. A proposta em estágio mais avançado de tramitação trata-se da Lei Geral do Licenciamento Ambiental, projeto elaborado pela Frente Parlamentar Agropecuária – FPA e setores da indústria (versão mais recente do PL 3.729/2004). O texto foi acolhido pelo setor ruralista e altera profundamente o processo de emissão dessas autorizações, extinguindo a necessidade de licenças para boa parte das atividades agropecuárias e empreendimentos de infraestrutura. Existe também a proposta, defendida pelo Ministro Ricardo Salles, de instituir o autolicenciamento de empreendimentos. Kim Kataguiri (DEM-SP), relator do projeto, argumenta que o objetivo é “conciliar celeridade com fiscalização e controle”. Por outro lado, Bolsonaro quer enfraquecer os órgão de fiscalização e acabar com o que ele chama “indústria de multas”. A celeridade do licenciamento ambiental, juntamente com os custos desse processo, é sempre pauta de discussão e sempre será no sistema capitalista. Todavia, isso depende do ponto de vista, enquanto empreendedores acusam o licenciamento de ser lento e burocrático, a população afetada o considera rápido e pouco efetivo para dar conta da quantidade de impactos causados pelas atividades poluidoras. Podemos fazer uma série de críticas ao licenciamento ambiental, mas elas serão, do ponto de vista socioambiental, diametralmente oposta às apresentadas pelo Governo e empreendedores. O interesse do capital será sempre sobreposto aos interesses socioambientais na democracia representativa. Mais uma vez a pergunta, a quem interessa a flexibilização e celeridade do licenciamento ambiental? Quem será beneficiado com este projeto?
Depois dos CRIMES ambientais de grandes proporções, com perda de vidas, como de Mariana/MG e Brumadinho/MG, falar em autolicenciamento e propor a flexibilização do que eles chamam de “burocracias”, mas na verdade são exigências técnicas, compensações, projetos de mitigação, é demonstrar que existe de fato muita coisa errada nesse sistema. As empresas responsáveis por estes crimes, Vale S.A. e Samarco Mineração S.A., esta última composta pela Vale S.A. e a anglo-australiana BHP Billiton, estão entre as maiores mineradoras do mundo e, como é esperado nesse sistema que favorece sempre os detentores do capital, continuam impunes e os sobreviventes sem qualquer justiça.
Outra área de ataque do Governo, são as Unidades de Conservação. Bolsonaro chegou a declarar que deseja extinguir a Estação Ecológica dos Tamoios (Esec Tamoios), localizada entre Angra dos Reis e Paraty, se possível por decreto. Após ser multado por pescar em local proibido dentro da Esec, Bolsonaro quer alterar esta Unidade de Conservação para transformá-la em uma “Cancún brasileira”. Ele alega, contrariando mais uma vez os estudos científicos, que esta UC “não preserva absolutamente nada” e o turismo poderia trazer bilhões de reais por ano à região. Bilhões de reais para quem?
Além de um aparente revanchismo, Bolsonaro ignora dispositivos legais que determinam que usinas nucleares devem ser localizadas em áreas delimitadas como estações ecológicas para monitramento ambiental, como é o caso das Usinas Nucleares de Angra dos Reis. Contudo, recentemete o jornal O Extra publicou matéria na qual afirmava que em Angra dos Reis e Ilha Grande existe atuação de milícias que incentivam e exploram a pesca predatória do camarão rosa além de cobrar taxas para permitir a pesca ilegal pra quem não possui registro geral de atividade pesqueira. Portanto, mais uma vez vemos indícios da família Bolsonaro atuando em favor de interesses de grupos milicianos.
Todos estes projetos de desmonte da política ambiental são para atender interesses de grupos econômicos específicos (agropecuária intensiva, indústria extrativista, setor de contrução de grandes obras, entre outros). Além de ser moeda de troca para fortalecimento político de determinados grupos e para escoamento duvidoso do dinheiro público. Para a população em geral, estas propostas só intensificam a destruição dos recursos naturais e social, expulsam populações tradicionais e povos originários de seus territórios de origem, desapropriam populações marginalizadas, aumentam o nível de poluição e doenças associadas e aumentam a desigualdade. Tudo em nome do lucro e da acumulação de capital. Só a resistência e a luta do povo pode reverter este processo.