Por Sindicato Geral Antônomo do Rio de Janeiro/SIGA-RJ
Um secretário que comanda sua pasta através de redes sociais. Sempre querendo passar a ideia de estar mais próximo da população (eleitores) e com projetos sacados praticamente de improviso. Assim tem feito Pedro Fernandes à frente da Secretaria Estadual de Educação (Seeduc). Mas, na atual conjuntura emergencial de combate ao Covid-19, o secretário de educação do Estado do Rio de Janeiro, elevou essa prática ao extremo. Não tendo uma base legal sólida para implementar uma modalidade de ensino nova, Pedro Fernandes apela para seus instrumentos de trabalho preferidos: sem emitir Resoluções, Circulares Internas ou qualquer documento oficial, ele impõe para rede o Ensino a Distância (EaD), através da ferramenta Google Classroom, e para isso não utilizou os meios oficiais, mas do Facebook, Instagram, Youtube e Whatsapp.
1. O secretário, defensor dos interesses dos empresários da educação
Das vezes que apresentou sua proposta de EaD, o secretário gerou mais confusão que esclarecimentos. Do que se pode entender, sua proposta mais se parece com um ensino domiciliar a distância, para quem possui acesso à tecnologia da informação e, ensino por correspondência para os excluídos digitais. Assim como ocorreu com o Armazém do Livro e com a verba para os passeios pedagógicos, o remendo de ideias, o amadorismo, a falta de planejamento e incompetência se misturam.
O resultado não poderia ser outro: o projeto de lei para a implementação de plataforma do EaD, PL 2036/2020, de autoria dos deputados Renan Ferreirinha/PSB, Sergio Fernandes/PDT, André Ceciliano/PT, Carlo Caiado/DEM, a proposta de implementação de plataforma de ensino a distância sofreu enormes críticas. Durante a audiência pública da ALERJ realizada no dia 31 de março, as críticas foram muitas, ao passo que o PL foi retirado da pauta de votação.
Apesar de não ter o apoio dos demais deputados estaduais, a Seeduc continuou com as ações para as aulas via Google Classroom. A situação é tão absurda que o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) recomendou, no dia 3 de abril, a suspensão das atividades online. Tendo a secretaria insistido em tais atividades, o MPRJ determinou, no dia 7 do mesmo mês, que elas não poderão ser computadas como dias letivos.
Mesmo sendo duramente rechaçado, o secretário Pedro Fernandes, insiste em impor a EaD. Mas porque insistir uma política que não recebe apoio? A resposta é simples: o secretário está atendendo os interesses dos empresários da educação, de fundações privadas que querem enriquecer ainda mais recebendo as verbas públicas para educação, com as fundações Lemann, Itaú, Ayrton Senna, Roberto Marinho, Bradesco, etc. Suas as ações permitem que esse setor empresarial entre de vez na educação pública estadual.
A atuação desses agentes não é segredo. Em seu website a Fundação Lemann diz: “Olhando para o futuro e buscando contribuir com o presente, estamos ao lado MEC (Ministério da Educação), do Consed (Conselho Nacional de Secretários de Educação) e da Undime (União dos Dirigentes Municipais de Educação) construindo propostas e soluções, além de mobilizar a colaboração e a participação de diversos setores” (https://fundacaolemann.org.br/public/noticias/acoes-para-fortalecer-a-aprendizagem-no-contexto-do-covid-19 – acessado em 31/03/2020). Tal intencionalidade se mostra através do PL 2036/2020, de 4 deputados, entre eles o Renan Ferreirinha. Este parlamentar, assim como outros pelo Brasil, como a famosa Tabata Amaral, teve seus estudos em Harvard bancados pela Fundação Estudar, do bilionário Jorge Paulo Lemman. Portanto, o PL de sua autoria, que visa implementar plataforma de educação a distância na rede estadual, tem interesses bem definidos.
Ao invés de estabelecer parceria com a Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação (Secti), que conta com a Cecierj, fundação estadual que atua com o EaD no ensino superior há décadas e atualmente é parceira da Seeduc no Ceja. A pressa com que Pedro Fernandes corre para a Google não é apenas uma ação midiática, mas revela os interesses do setor privado na educação pública. Portanto, colaborar com o EaD hoje é endossar o avanço da perda de direitos, da autonomia pedagógica, da qualidade do ensino-aprendizado, de postos de empregos e de salários num futuro próximo. Em outras palavras, é elevar o nível de exploração do trabalhador da educação, precarizar as condições de trabalho e ensino e aumentar os lucros dos empresários.
2. Por que temos que boicotar o EaD?
Em primeiro lugar, a imposição da Seeduc sequer está de acordo com a legislação atual. O Decreto 9.057/2017, que regulamenta o EaD previsto na LDB, em seu Artigo 1º considera “educação a distância a modalidade educacional na qual a mediação didático-pedagógica nos processos de ensino e aprendizagem ocorra com a utilização de meios e tecnologias de informação e comunicação, com pessoal qualificado, com políticas de acesso, com acompanhamento e avaliação compatíveis, entre outros, e desenvolva atividades educativas por estudantes e profissionais da educação que estejam em lugares e tempos diversos.”
A maior parte das professoras e professores da rede estadual foi ingressa para o regime presencial e não teve formação para a modalidade a distância, que tem uma pedagogia própria. É um absurdo querer implementar uma nova nodalidade de ensino sem profissionais qualificados.
Em segundo lugar, no que diz respeito à política de acesso, a situação é mais grave, pois a Seeduc hoje deixa de fora o alunado mais carente. É sabido que nem todos as famílias dos estudantes da rede estadual de ensino possuem acesso efetivo as tecnologias digitais necessárias para o ensino a distância e suas famílias. Na educação presencial, aqueles que sofrem com a exclusão digital estão tendo acesso ao mesmo processo de ensino-aprendizagem que os seus companheiros de turma. Essa condição de igualdade será negada com a imposição do EaD em tempos de quarentena.
Embora diante das câmeras o secretário diga que os estudantes que não tem acesso aos meios digitais são a sua prioridade, ao quebrar o princípio da isonomia, na prática ele reforça a exclusão, subtraindo-lhes o direito universal e democrático a educação. Se realmente estamos preocupados que os estudantes não sejam prejudicados, então não podemos aceitar tamanho absurdo.
Em terceiro lugar, a implementação dessa modalidade vem sendo cuidadosamente preparada pelas fundações empresariais que desejam abocanhar as verbas da educação. Fundações já citadas, como a Lemman, Itaú, Ayrton Senna, Roberto Marinho, entre outras, estão à frente da BNCC e do Novo Ensino Médio e atuam com lobistas nas secretarias de educação e no MEC. Elas estiveram articulando a elaboração das recentes alterações na legislação educacional brasileira. Também estão por trás do EaD, com suas plataformas digitais, seus materiais didáticos, seus cursos de formação, suas visões mercadológicas de educação, suas relações de uberização do trabalho docente, sua ganância pelo dinheiro que deveria ser da escola.
Por último, a proposta da Seeduc, embora seja confusa, apresenta algumas características bem nítidas como: o economicismo como princípio e o conteudismo como método didático-pedagógico. O avanço ideológico do neoliberalismo introduz a visão de que a produtividade, tal como numa empresa, é o objetivo de todo fazer humano, portanto da educação também. Há metas a serem cumpridas e ninguém pode estar parado, sob o ponto de vista do neoliberal. Há um grande apelo para que docentes e discentes não fiquem ociosos no período de isolamento social, como se estar de quarentena significasse “não fazer nada”. Estamos enfrentando uma pandemia, não lidando com uma gripezinha. As pessoas estão tensas, convivendo com o medo de uma doença mortal, de um colapso econômico e social. Não estamos à toa, tirando férias! Há muito trabalho sendo feito, especialmente pelas mulheres para quem, dado o machismo estrutural, recaem os cuidados domésticos e maternos.
A produtividade neoliberal para a educação, apesar de apresentar uma roupagem moderna, se mostra conservadora nos costumes. Mesmo defendendo o uso de tecnologias da informação, a base metodológica que a Seeduc apresenta é toda voltada para o conteúdo. Quantas vezes ouvimos o secretário, diretores, professores, alunos e responsáveis repetirem que estão preocupados com “a perda de conteúdos” Pois bem, o fazer pedagógico não se resume aos conteúdos das disciplinas. Ensinar-aprender não é compilar uma série de informações. Existem aspectos sociais, psicológicos, afetivos, emocionais, artísticos, políticos, culturais… envolvidos no processo de ensino-aprendizagem e a produtividade disso não pode ser mensurada, nem cobrada.
3. Boicotar o EaD, defender o direito à educação!
A defesa do direito à educação dos estudantes das famílias da classe trabalhadora é tarefa dos trabalhadores e trabalhadoras da educação de dos próprios estudantes. O governador Witzel. O secretário Pedro Fernandes, os deputados da Alerj, o Google, as fundações privadas, defendem somente seus próprios interesses e os interesses dos poderosos.
Lutar pelo direito à educação hoje é boicotar a imposição do EaD na rede estadual de ensino, exigir a suspensão do calendário, a flexibilidade dos 200 dias e das 800 horas levitas. Assim, o direito ao acesso igualitário à educação e as condições de trabalho e estudo serão preservados. Avante na luta pela educação, não ao EaD imposto pela Seeduc.
Pelo direito à luta pela educação, não ao EaD!
Só povo salva o povo!
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