O que é o plebiscito popular e por que discordamos?
Brasil, 7 de setembro de 2014
Comunicado Nacional da RECC nº 18
Versão em PDF.: Comunicado Nacional nº18 [7 de Setembro de 2014]
1) O que é o plebiscito e a defesa da moralização da política representativa
A proposta do “Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva pela Reforma Política” nasce em novembro de 2013, como resposta as manifestações de junho. Segundo seus proponentes, todas as principais bandeiras erguidas durante o levante popular de junho do ano passado – tais como o passe-livre, o direito à moradia, a saúde e a educação – afunilam-se e são representadas em um problema chave, que seria o da reforma política, essa proposta foi condensada em uma cartilha.
O argumento utilizado é que o atual Congresso Nacional, subordinado aos interesses do capital, não consegue implementar políticas de interesse popular, tal como é assegurado na constituição, mas que não se cumpre. Então, ter-se-ia a necessidade de convocar uma Constituinte que instaure outro método de eleição e organização política, ou seja, com novos delegados/deputados eleitos com o único objetivo de modificar a estrutura política do país. Note-se, embora também seja criticável, que sequer se trata da clássica proposta de Assembleia Constituinte para tratar de amplos temas, como a estrutura econômica brasileira, mas tão somente da estrutura política, sobretudo eleitoral.
Assim o plebiscito é convocado por setores governistas – o governismo escancarado (PT/CUT/PCdoB/UBES), o governismo envergonhado (LPJ/MST/CIMI) e setores paragovernistas (como a corrente do Psol da candidata Luciana Genro, MES) – como uma resposta às manifestações de junho.
O motivo da campanha, como a própria cartilha afirma é, prioritariamente, defender “o aperfeiçoamento da democracia representativa, com a reforma do sistema eleitoral“ e “o fortalecimento da democracia direta e participativa, com controle social“.
A cartilha explicita que há necessidade de uma reforma politica através dessa constituinte para que o Brasil possa realizar reformas de caráter democrático-burguês em uma clara visão de que o país precisa desenvolver suas instituições burguesas – “democratizar a democracia” – para consolidar o Estado Nacional como soberano.
2) A estratégia governista
A estratégia governista e para-governista possui quatro objetivos: 1) buscam, de modo oportunista, legitimarem-se como representantes do Levante de Junho; levante este que o governismo (PT/PCdoB), a época, caracterizou como reacionário, além de apontá-lo como um prelúdio para um golpe da direita e afirmar que a bandeira “Não vai ter Copa!“ também é de direita; 2) simultaneamente, criam uma linha desvionista das questões centrais que emergiram durante o levante, de caráter reivindicativo-econômicas, como o passe-livre, o direito a moradia, a universalização da saúde e a educação pública de qualidade.
Esta estratégia desvionista buscou, ao mesmo tempo: 3) blindar o governo Dilma/PT de criticas ao buscar centralizar o problema na estrutura da politica burguesa e não no governo especifico, eliminando-o como um poderoso agente responsável pela manutenção do problema estrutural, criando uma confusão proposital e 4) buscando de forma cínica/oportunista disputar a memória coletiva do movimento para, através desse plebiscito, fortalecer um bloco da burguesia hegemônica (PT/PCdoB) contra o outro bloco burguês (PSDB/DEM) no parlamento.
3) Porque rechaçá-lo e “o que fazer”?
A proposta do plebiscito está de acordo com a estratégia do Programa Democrático Popular (PDP), assumido pela Consulta Popular e por correntes interna do PT. O PDP defende uma etapa democrático-burguesa do desenvolvimento social com o propósito de fortalecer o Estado Nacional. Esta estratégia é, por essência, conciliadora. Ela compreende que os trabalhadores e a burguesia nacional devem se unir contra o suposto inimigo comum, o Imperialismo.
Entendemos que os interesse dos trabalhadores e da burguesia são inconciliáveis e que a estratégia democrático-burguesa representa, do ponto de vista teórico e político, o que há de mais atrasado/degenerado. A burguesia nacional, longe de ser inimiga do imperialismo, é na verdade sua sucursal. Ela mesma reproduz ensinamentos do imperialismo, a exemplo das influentes empresas transnacionais brasileiras que exploram força de trabalho e matéria prima no exterior para trazer o lucro para si, ou o papel militar que possui o Estado brasileiro no Haiti.
Neste sentido, o plebiscito objetiva fortalecer o bloco hegemônico governista e neutralizar as bandeiras de caráter reivindicativo econômico, as quais o governo não pode atender sem romper com os seus aliados dos distintos setores da burguesia. Ocorre que, como dissemos em nosso Comunicado nº 16, a base governista encastelada nos sindicatos e centrais pede o impossível, quer dizer, exigem o que “por força material, o governo petista é incapaz de fazer sob pena de perder sua governabilidade: romper com a burguesia.” Ao mesmo tempo, é claro, que hoje fazem desvergonhada campanha eleitoral para o mesmo governo que… governará com a burguesia.
O Levante de Junho teve como centro pautas de caráter reivindicativo-econômico como passe-livre, moradia, saúde e educação. Nós da RECC/FOB acreditamos que o governo Dilma/PT-PMDB não poderia atender as pautas de caráter econômico sem romper com o interesse dos seus aliados da burguesia nacional. Ao mesmo tempo em que não poderia romper com a burguesia, pois sem este apoio não se elegeria como governo.
E é justamente por não poder atender o passe-livre estudantil irrestrito sem romper com a máfia dos transportes, não poder ter um programa de moradia sem romper com o lobby da especulação imobiliária, não poder universalizar a educação pública e efetivar os trabalhadores terceirizados da educação sem romper os acordos os tubarões do ensino, não poder dar terra aos camponeses e indígenas sem romper com o agronegócio e é justamente por não poder romper com esses acordos que o governo agora cria essa estratégia desvionista que tenta moralizar a politica representativa já tão desgastada. Mas erram, fazem parecer que o problema é dos sujeitos que no Congresso estão, e não um problema do regime político-econômico, como se mais mulheres, jovens ou trabalhadores no parlamento alterasse a estrutura social. É mais fácil que o meio modifique estes sujeitos!
O papel daqueles que estão comprometidos com a classe trabalhadora não é querer salvar o parlamento burguês nesse momento de crise da representatividade burguesa. Também no Comunicado nº 16, afirmamos: “Há então um interesse comum dos partidos reformistas e seus apêndices sindicais, que é a defesa da própria ordem sindical pelega e estatal-eleitoral. Enquanto o povo avança desprendendo-se aos poucos, mas criticamente, das ilusões parlamentares (seja pelo elemento ‘moral’ da corrupção ou abstencionista nas eleições, seja com uma prática insurrecional contra símbolos estatais), os reformistas do governo ou da ‘oposição’ se lançarão na defesa de seus redutos eleitorais, disputando as migalhas de confiança do povo ou pretendendo retomar a confiança em parte perdida no Estado-burguês. E suas táticas eleitorais certificarão nossa análise. Ao invés de aumentar a cisão aberta entre a política do povo, de um lado, e a política do Estado e do Capital, de outro, buscarão sarar essa fissura. Incorrem num erro perverso e contrarrevolucionário.” Nós, ao contrário, queremos afundar e deslegitimar perante ao povo o parlamento, que na verdade é apenas um embuste.
Acreditamos que as bandeiras de caráter reivindicativo-econômico no atual contexto de crise econômica quando encaradas em conjunto assumem justamente um caráter estrutural. Portanto, não devemos nos iludir com o desvionismo do governismo, devemos erguer bem alto as bandeiras reivindicativo-econômicas, defender o passe-livre nos transportes, terra para quem nela trabalha, moradia digna para todos, saúde e educação de qualidades universalizadas e rechaçar a tentativa de moralizar o parlamento burguês. Pois temos certeza de que: no Estado burguês, não existe governo dos trabalhadores. A emancipação dos trabalhadores será obra dos próprios trabalhadores, ou não será!
Para não ter protesto em vão! Par a sair deste antro estreito!
Façamos nós com nossas mãos tudo o que a nós diz respeito!
não creio na conciliação das classes!
Exatamente, nem nós! Por este motivo não construímos plebiscito por reforma política, pois seu meio será invariavelmente parlamentar e através da “sociedade civil”. Ou seja, burguês na primeira e policlassista na segunda.
Pela força do povo nas ruas, venceremos!