Contribuição ao 2º ENOPES,
2017
A presente tese tem como objetivo contribuir para um balanço da conjuntura nacional e internacional e indicar caminhos para construção do FOB e do Sindicalismo Revolucionário no Brasil. As reformas neoliberais comandadas pelo PMDB têm uma profundidade histórica muito grande, acenam para novos cenários da luta de classes dentro de uma nova divisão internacional do trabalho e de um novo patamar de superexploração global da força de trabalho. Por um lado, a dissolução do bloco no poder e a intensificação das reformas tende, no curto prazo, a deteriorar as condições de vida do povo. Por outro lado, vários mecanismos de controle e domesticação social, que davam governabilidade ao conjunto do sistema, serão removidos, e no médio prazo aumentará a polarização de classes.
Nesse sentido, no médio prazo, novas forças da classe trabalhadora, destrutivas e criativas, serão liberadas, e será travada a batalha histórica pela formação da consciência da nova classe trabalhadora em gestação. Contra estas novas expressões de luta da classe trabalhadora irão opor-se a velha burocracia reformista degenerada: o PT, o PCdoB e todas as suas forças acessórias. E para esta batalha que os sindicalistas revolucionários devem estar preparados, para ajudar a classe trabalhadora a encontrar seu caminho rumo a autonomia.
A classe trabalhadora, em suas diversas expressões, tende a insurgir-se. Mas as formas insurrecionais precisam se consolidar, dando o salto qualitativo, de expressões temporárias de revolta para a organização permanente da insurgência.
O II ENOPES deve continuar o trabalho, de dentro das insurgências, para que se construa uma confederação sindicalista revolucionária, capaz de levar adiante a luta por uma sociedade socialista no Brasil. E este é o primeiro passo, mas essencial, da libertação da classe trabalhadora brasileira.
1 – Conjuntura internacional
Há uma Nova Guerra Fria em curso. Essa é a principal constatação que se impõe. Depois da crise de 2007-2008, que resultou nas insurreições do Norte da África e da Síria, o conflito político-miliar entre EUA-UE e Rússia-China se aprofundou drasticamente. Essa nova guerra fria é o resultado da evolução da Guerra ao Terror e do fortalecimento econômico e geopolítico de China e Rússia. Sendo o fato central da conjuntura, essa nova guerra fria tem tido como cenários principais a Síria e a Líbia, no “grande Oriente Médio” (que compreende o Norte da África) e também, mais recentemente, a América Latina (com a crise dos regimes “progressistas de esquerda”, as sucessivas tentativas de golpe na Venezuela e o golpe parlamentar no Brasil em 2016).
A Guerra Fria II, iniciada no final dos anos 2000, reproduz vários elementos da primeira. Os mesmos blocos de Estados estão em disputa. Mas a política econômica que opõe cada bloco não é mais o “socialismo “ (ou, um capitalismo de Estado integral, como era a política da URSS) e um capitalismo de Estado liberal keynesiano (ou seja, parcial), hoje as políticas são de um capitalismo neoliberal do bloco EUA-UE versus um capitalismo de Estado minimalista, igualmente neoliberal, do bloco China-Rússia.
As diferenças de ideologia econômica praticamente desapareceram e o confronto é basicamente devido à necessidade de sobrevivência e disputa de hegemonia no sistema interestatal capitalista. Isso significa que, ao contrário da Guerra Fria I, quando existiam forças revolucionárias autênticas que buscavam abrigo sob a política da URSS-China, hoje, a política da Rússia é de destruir essas forças apoiando os governos autoritários neoliberais, como mostra o caso do apoio ao Governo neoliberal de Bachar al Assad, na Síria.
Desse modo, a luta interestatal atual não reflete, em nenhum nível, a luta de classes internacional. Isso significa que os blocos precisam manipular ideologicamente as suas classes trabalhadoras nacionais para obter o apoio interno indispensável a sua política externa. Essa separação, entre os interesses e conteúdo econômico-político da luta interestatal e os interesses das massas trabalhadoras globais, implica que há um grande terreno para o desenvolvimento das soluções internacionalistas. Elas precisam ser construídas.
O acirramento da competição inter-imperialista pode ou não evoluir para uma guerra direta entre potências. Mas a intensificação dos conflitos militares apenas reforça o caráter mundial da guerra. Desse modo, a polarização entre os Estados e blocos exige uma polarização, o melhor termo é maniqueísmo, ideológico. Esse maniqueísmo é uma forma de tentar aglutinar forças dentro de cada bloco para combater o bloco opositor. É por isso, dentre outros motivos, que há um franco fortalecimento da tendência conservadora em escala global.
As eleições presidenciais no EUA, com a vitória de Donald Trump, mostram que as burguesias nacionais estão apostando numa solução conservadora regional. A ascensão de uma ala ultraconservadora do Partido Republicano apenas sinaliza para um movimento em direção ao militarismo. A vitória de Macri na Argentina, o golpe parlamentar que colocou Temer e fortaleceu o setor clerical-militar (a “Bancada da bíblia” e a “Bancada da bala”) no Brasil, criaram um alinhamento mais rígido entre os principais Estados da América Latina e os EUA: Brasil, México, Argentina estão todos hoje dentro de uma área de influência direta do governo dos EUA.
Os governos progressistas-desenvolvimentistas, apesar de alinhados, buscavam competir com os EUA por mercados e por posições de poder, como aconteceu com a ilusão de “Brasil Potência” da era Lula/PT. Esse realinhamento conservador na América Latina atende a uma economia política e uma guerra ideológica, de que falaremos abaixo.
1.2. América Latina
A Guerra Fria II eclodiu num momento em que a economia mundial sofreu uma importante transformação. O capitalismo ultramonopolista, que nos anos 1990 tinha assumido uma forma quase que exclusivamente financeira, nos anos 2000 passou por outra transformação: a ascensão do neoextrativismo. O neoextrativismo foi o domínio da grande indústria do petróleo e do Gás, sobre os recursos naturais globais, especialmente energético, e por extensão, sobre a própria economia mundial. Para que essas empresas, especialmente as norte-americanas, alcançassem essa posição de poder, a guerra e invasão do Iraque foi fundamental. Mas não foi suficiente.
O neoextrativismo induziu assim a necessidade de uma luta dos capitais monopolistas em ascensão pelo controle de posições estratégicas. A grande contradição é que em quase todo mundo os recursos energéticos, especialmente o petróleo, são controlados ou regulados pelo Estado. Grandes empresas petroleiras são estatais em diversos países ou exploram de forma associada com o capital estrangeiro. Desse modo, a necessidade de ter o controle dos mercados de energia exigia uma profunda reestruturação dos Estados nacionais, para modificar o controle do petróleo e outros recursos naturais. A necessidade era estender o neoliberalismo para o controle desses recursos, com a privatização dos campos e a penetração do capital estrangeiro na produção, mesmo em áreas em que os acordos anteriores previam a exploração estatal.
O conflito econômico entre gestão estatal capitalista e exploração capitalista privada dos recursos naturais é o centro da contradição da economia política atual. Aos EUA interessa um controle mais direto das fontes de energia e sua exploração. A fragmentação da Líbia, por exemplo, foi comemorada pelas grandes petroleiras do mundo, grande parte delas, dos EUA. A mesma tentativa foi realizada na Síria e o mesmo na Venezuela, que possui as maiores reservas de petróleo do mundo. O Brasil, depois do Pré-sal, foi colocado também na rota dessa economia e geopolítica. A queda do preço do petróleo, em parte fabricada pelos EUA, levou a uma crise do neoextrativismo. A baixa do preço do petróleo serve bastante ao processo de concentração de capital, facilitando a expansão do grande capital monopolista. A queda do preço também se deve às disputas geopolíticas entre potências.
Um exemplo é o Tratado Transpacífico e Transatlântico, que buscam ampliar a área de influência comercial dos EUA nas Américas e combater a presença do bloco Sino-russo na América Latina. Rearticulação do Imperialismo estadunidense pós-crise na América Latina através da Aliança do Pacífico.
Esse ciclo neoextrativista propiciou também certa autonomia relativa da esquerda bolivariana na América Latina frente ao Imperialismo estadunidense, posto que esta também estava baseada no pacto de classes e na venda de produtos primários para China, Rússia e Irã. Essa autonomia relativa em nada significou para o avanço da classe trabalhadora, ao contrário, o bolivarinismo representou uma outra forma de capitalismo – mais extrativista do que especulativo – e outra forma de Estado – mais tutelar e autoritário do que liberal.
Em toda a América Latina o desgaste desse ciclo neopopulista está ancorado em três principais eixos: 1) no fim da valorização das commodites pela re-orientação da China de menor crescimento do PIB e maior crescimento da economia doméstica; 2) Pelo ataque sistemático do Imperialismo estadunidense em colocar alguém “puro sangue” que defendesse a privatização das empresas nacionais de energia – Venezuela, Argentina, Brasil – 3) Na ruptura do movimento de massas com os pactos sociais efetuados pelas burocracias, a ruptura se deu pelos setores mais superexplorados da classe – carpeiros no Paraguai – indígenas da Media Luna e Gasolinaso na Bolívia – proletariado marginal no Brasil, etc. Esse ciclo de rupturas nos coloca numa tarefa de aprofundá-las e apresentar uma alternativa classista internacionalista que agregue setores do proletariado de nosso continente.
É por isso que não podemos ter ilusões. O controle “estatal”, como mostra o exemplo do petróleo, não é uma política do proletariado. O controle estatal do petróleo serviu à construção de Estados autoritários e corruptos do terceiro mundo, não à emancipação do proletariado. O fato do imperialismo precisar destruir esse controle é resultado de uma necessidade econômica, não uma diferença ideológica. Isso significa que as políticas de defesa do capital nacional ou das empresas estatais são políticas fadadas ao fracasso. A economia política hoje está dominada pelo pensamento burguês e conservador. É preciso uma nova política econômica, do ponto de vista socialista e dos trabalhadores. E essa política econômica será anti-estatista e anti-capitalista.
Considerando o contexto latino-americano, seu lugar na luta de classes internacional, concluímos que a (re)construção do Sindicalismo Revolucionário jamais pode estar limitado ao contato como entidades internacionais do sindicalismo revolucionário europeu, mas também articulações populares, sindicais e estudantis da Argentina, Venezuela, Bolívia, Paraguai, Colômbia e outros.
1.3. As forças religiosas e policiais-militares e as ideologias racista, patriarcal e militarista: a reação
Essa Guerra Fria II tem tido um efeito curioso. Ela deu um novo fôlego as forças clerical-militares (ordens religiosas e forças policiais-militares) e as ideologias racista, patriarcal e militarista. Vejam, essas ideias são extremamente úteis na mobilização interna para o apoio ao Estado, especialmente em caso de guerra. A difusão de ideias racistas, militaristas e religiosas facilita tal aglutinação.
Mas o sistema capitalista mundial estava evoluindo em outra direção. O capitalismo, desde a falácia da globalização neoliberal, estava assentado no multiculturalismo e na democracia. Organismos como ONU, Banco Mundial adotaram políticas voltadas para temas como gênero, raça, ao lado do combate a pobreza, como mecanismo de levar ao “desenvolvimento os países subdesenvolvidos”. A estratégia de investir em políticas de gênero e raça visava o esvaziamento da mobilização de em torno das ideias de classe-povo ou povo-nação. Quer dizer, em países em que os movimentos sociais tentavam aglutinar camponeses e operários para a resistência e a luta, esses organismos tentavam criar organizações e políticas que introduziam as ideias de que a democracia ocidental era “superior” às políticas anticapitalistas, explorando contradições de gênero e étnicas que efetivamente existiam, mas não para emancipação desses grupos, mas para atrelarem as mesmas ao poder imperialista.
Desse modo, o imperialismo não se expressa apenas pelas ideias mais “atrasadas”, da reação clerical-militar, mas também pelas ideias pós-modernas conservadoras. Na atual Guerra Fria o capitalismo alcançou um tal grau de contradição interna que frações das classes dominantes estão atacando as ideias da classe dominante, criadas para domesticar e dividir a luta do proletariado, como se fossem ideias do próprio proletariado. O que o proletariado não pode é se deixar tomar pela mesma ilusão: é preciso distinguir o caráter de classe. Podemos dizer que temos um conjunto de ideias opostas, mas que cumprem a mesma função: o racismo/nacionalismo xenófobo x multiculturalismo/regionalismo estatista; o patriarcalismo x feminismo empresarial; o militarismo x pacifismo conservador.
O racismo é um aspecto estrutural do sistema capitalista. Mas a ele tem uma função complementar ao multiculturalismo e o regionalismo estatista, ou seja, aqueles que defendem uma coexistência multicultural no Estado, ignorando as desigualdades econômicas ou defendendo diferentes formas de capitalismo “humano”, bastando a isso garantir o acesso de minorias aos cargos das empresas e de governo. O patriarcalismo se bate contra as mulheres, mas o feminismo empresarial, aquele que considera que as mulheres têm como inimigos o homem, e não um sistema, e que ela deve se emancipar pelo mercado, chegam a mesma conclusão: a necessidade de manter homens e mulheres em posições de poder desiguais; por fim, existem os apologistas do militarismo e da violência, e os pacifistas conservadores, ambos concordam que a violência deve ser monopólio do Estado. Os primeiros querem que o Estado faça uso ostensivo da violência, os segundos alimentam a ilusão de que ele não faz ou não deveria fazê-lo.
Não por acaso, na Rússia e EUA desenvolve-se um conservadorismo (como explicitado pela perseguição aos homossexuais e a liberdade sexual em geral). Esse processo tem levado a uma política de explorar o confucionismo, seja com a tentativa de criar movimentos de direita com identidade cultural de esquerda (exemplo, o nacional-bolchevismo, o nacional-anarquismo) seja pela aproximação do stalinismo de uma política moralista-conservadora, como se a superioridade moral fosse o traço dos comunistas. A russofilia e russofobia são produtos do desenvolvimento da Guerra Fria e ela tende a ser usada pelos comunistas como forma de tentar unificar seu campo e criar o apoio a Rússia. Dinâmica de fortalecimento do estatismo em escala internacional, visando um eminente enfrentamento direto. Sem guerra, os blocos tendem a se desagregar. Mas o fascismo dos EUA e o fascismo da Rússia se disfarçam, cada um a seu modo, mas são gêmeos siameses e procuram aprofundar a confusão ideológica nas massas.
Essas ideias, longe de serem alternativas, são duas faces da mesma moeda. Essas ideologias não podem expressar os interesses e aspirações dos povos em luta. Mas essas ideologias têm desviado os povos da sua emancipação e o preço desse erro tem sido pago em sangue inocente. Por isso hoje, mais do que nunca, é necessária uma luta ideológica. Essa luta ideológica precisa afirmar a independência dos povos e dos trabalhadores frente ao conflito interestatal da nova guerra fria.
1.4. Insurgências globais e crise direção-base: lições a aprender e os rumos a seguir
Várias insurreições ocorreram ao longo dos anos 2000 e batizaram a Nova Guerra Fria. Nos anos 2000, na Europa e Gênova, nas França, na Grécia e depois em 2011, na Espanha; no Norte da África, Líbia, Egito, Tunísia e Síria conheceram também insurreições populares.
Enquanto na Europa os alvos das insurreições foram os governos neoliberais e o capital financeiro, na sua grande maioria, no Norte da África essas insurreições se realizaram contra antigos governos nacionalistas, da ex-área de influência da URSS. Esses governos na sua maioria, assim como a própria Rússia, estavam adotando políticas neoliberais e estas provocaram, depois da crise de 2008, um agravamento das condições sociais.
As insurgências populares foram assim respostas à expansão do neoliberalismo, mesmo sob os governos “nacionalistas-progressistas”. O mesmo aconteceu em 2013 no Brasil: a insurreição foi um ato de resistência às políticas neoliberais e de favorecimento do capital estrangeiro, que aumentaram a superexploração no país.
A questão é que as insurgências explicitaram a fragilidade dos governos, especialmente os nacionalismos-progressismo em crise, que defendiam, justamente, a política de manter o controle dos recursos naturais nas mãos do Estado. Essas insurgências não foram provocadas pelo imperialismo. Elas mostraram ao imperialismo, especialmente ao EUA, que vários de seus aliados estavam fracos, e que podiam ser “realinhados” mais facilmente, como na América Latina. Ou no caso da Líbia e Síria, com o apoio a fragmentação dos Estados e guerra indireta com a Rússia.
As insurreições estão se espalhando pelo mundo. Essas insurreições têm criado novas formas organizativas. Suas contradições têm sido exploradas pelos blocos imperialistas em disputa. Mas são dessas insurgências que podem surgir as verdadeiras alternativas anti-imperialistas.
O que as insurgências mostram é que o que chamamos de crise entre direção/bases se manifesta, em certo grau da luta de classes, na relação povo-classe versus governos-Estados (como foi o caso da Líbia e da Síria). Nesses países a crise foi tão profunda que a insurgência se converteu em luta armada. A intervenção dos blocos EUA-UE e China-Rússia apenas aproveitou-se da situação criada pela insurgência para desorganizar o povo, criando forças militares alinhadas a cada bloco ou forças mercenárias. Somente em Rojava, na região do Kurdistão, graças ao trabalho do PKK e da resistência popular e feminina, surgiu uma alternativa de poder e organização.
Outra experiência fundamental é o movimento Zapatista no México. A Guerrilha Zapatista foi lançada ainda em 1994 e ainda constitui uma força popular autônoma considerável, polarizando com as classes dominantes do Narco-Estado mexicano e rivalizando com o Imperialismo estadunidense (em 1994 foi o ano de lançamento do NAFTA). Uma das principais referências para a luta de classes na América Latina, o movimento Zapatista é uma expressão do autonomismo de base indígena e popular.
Desse modo, as insurgências são formas de resistência anti-imperialista em essência. Mas quando estas insurgências não conseguem evoluir para formas de organização permanentes, o vácuo deixado por elas é ocupado pelas forças da reação e contrarrevolução, criando novos mecanismos de dominação. Diante do acirramento da conjuntura macropolítica e da crise mundial do estatismo, afinidade ideológica entre os blocos pode impulsionar ações comuns de contra-insurgências.
1.5. Contra a “Santa Aliança” da Reação, uma Aliança Internacionalista dos Trabalhadores
A conjuntura internacional exige uma política clara. Nenhum apoio aos governos e aos blocos imperialistas. Nem EUA, nem a UE, nem Rússia, nem China, representam o anti-imperialismo. A palavra de ordem abaixo as “Santas Alianças” dos Estados Imperialistas, pela reconstrução das organizações internacionais dos trabalhadores. É cada vez mais necessária uma aliança internacionalista dos trabalhadores.
A solidariedade internacionalista entre os povos não pode ser confundia com o apoio aos Estados; a condenação aos Estados não pode significar a negação da solidariedade entre os povos. Por isso é preciso distinguir que o apelo a organização e ação deve ser dirigida, especialmente, aocampesinato global e os demais trabalhadores, que estão sendo as principais vítimas da Nova Guerra Fria. Esse campesinato deve ser chamado a participar de uma luta por Terra e Liberdade: terra, para que ele tenha a autogestão e expulse o capital-imperialismo; liberdade da dominação colonial estrangeira, da dominação oligárquica e estatal interna. Rojava e Chiapas, com todas as contradições, são os melhores exemplos dessa luta.
2 – A conjuntura nacional: dissolução do bloco no poder, fascistização e o grande capital
A crise política brasileira evoluiu para uma polarização social. As manifestações de massa dos dias 13 de março de 2016 (dirigida pelo bloco burguês-conservador ou a chamada “direita”) e do dia 18 de março (do bloco socialdemocrata-governista, dirigida por um setor de pequena burguesia e da aristocracia operária e sindical, a chamada “esquerda”) mostram que tal polarização social alcançou num nível significativo.
Uma correta teorização é precondição para uma correta linha de ação, especialmente quando a polarização social entre direita e esquerda induziu ao empobrecimento do debate político, a uma leitura maniqueísta e a soluções simplistas e contraditórias. Nós sabemos que a complexidade da situação e seu dinamismo não nos permite fazer afirmações categóricas, nem temos a pretensão de ter uma leitura completa. Mas assumimos com humildade a responsabilidade de fixar um ponto de vista anarquista e revolucionário e contribuir para aqueles que querem uma alternativa, que não seja nem burguesa e conservadora, nem governista.
Essa tarefa se mostra mais necessária em razão do fato do bloco burguês-conservador e o bloco socialdemocrata estarem pautando a política e a luta de massas. Em 2013, a ação direta de classe e a extrema esquerda pautaram a política nacional. Mas a desorganização e fragmentação das massas, a imaturidade de suas formas organizativas, fez com que essa força criadora não pudesse se colocar como uma alternativa hoje. Essa autocrítica precisa ser realizada por todos os setores combativos e libertários.
Nós também subestimamos a ofensiva burguesa. Nos parecia que o caminho mais provável seria desgastar lentamente o PT sem tentar derrubar o governo, aguardando 2018. Hoje, tal ofensiva se mostra sob a forma de um golpe, não um golpe de Estado, mas de um golpe institucional dentro de um Estado de Exceção criado pelo bloco no poder do qual o PT faz parte e que agora quer tirar as funções dirigentes do PT por meio do impeachment (esse modelo de golpe institucional possui paralelos em Honduras em 2009/10 e no Paraguai mais recentemente). Nesse sentido, precisamos compreender essa crise no seu aspecto inovador e suas implicações, pois elas podem modificar bastante os cenários da luta de classes. A burguesia lançou uma ofensiva contra o PT e suas bases de classe e possivelmente irão derrubar o governo do PT com o impeachment.
Por isso fixamos aqui alguns elementos necessários à compreensão da crise. Ao contrário de ser uma luta entre “direita e esquerda”, ou entre os “defensores da democracia contra o golpe” ou da “democracia contra a corrupção”, essa luta expressa contradições de classes, geopolíticas e de nuances estratégicas de cada bloco. Podemos dizer que a atual situação, hoje, tem dimensões que exigem compreensão: 1) a geopolítica e concorrência imperialista; 2) a ruptura do bloco no poder; 3) a agudização da luta de classes pela apropriação da renda nacional.
2.1. Equilíbrio geopolítico e concorrência imperialista
A atual crise política não pode ser compreendida sem levar em consideração a geopolítica e concorrência imperialista aprofundadas pós-2008. A crise de 2008 levou à estagnação nos países centrais, EUA e UE. Uma das soluções encontradas foi a exportação de capitais para a periferia. Foi nesse contexto que o Governo Lula/PT, bem como outros governos de esquerda latino-americanos, teve seu período de ouro. O capital estrangeiro curiosamente foi a base para financiar o crescimento econômico e superar a estagnação das políticas neoliberais anteriores.
A crise de 2008 então provocou uma exportação de capitais para o Brasil e possibilitou uma nova aliança entre o capital nacional, o capital estrangeiro e Estado em torno de política de crescimento, possibilitando ao mesmo tempo um bloco de poder que representava uma aliança entre capital e trabalho, materializada pelo governo PT-PMDB. Essa aliança foi regional: nos principais países da América ocorreu um esgotamento da direção burguesa conservadora e ascenderam governos de esquerda liberais ou socialdemocratas (Partido Democrata e Obama nos EUA; Partido Justicialista e os Kishner na Argentina: Evo Morales e MAS na Bolívia; Tabaré Basquez e Mujica dos Tupamaros no Uruguai; e Lula e Dilma do PT no Brasil). Essa coalização regional promoveu um relativo desenvolvimentismo em face das formas reacionárias e conservadoras impostas anteriormente pelo Partido Republicano e por Bush nos EUA, e ainda uma onda de intervencionismo econômico estatal. A exportação de capitais criou então uma associação de interesses e possibilitou uma nova aliança, desta vez, dirigida por partidos de esquerda de base operária e/ou sindical em diversos países.
Mas essa tendência não tocou nos fundamentos econômicos da dependência, ao contrário, aprofundou as mesmas. Também na significaram mudanças nas condições de vida do povo latino-americano, na verdade, os governos progressistas de esquerda contribuíram para o aperfeiçoamento do Estado Militar-Policial, o que se observa com o crescimento da violência e da pobreza[1]. Assim, depois da crise de 2008, esses governos foram todos envolvidos num compromisso de superar a crise internacional. Isso possibilitou que esses governos tivessem a vantagem de promover crescimento econômico nos seus países sem confrontar os interesses do imperialismo, ao contrário, associando-se a estes.
Mas a busca de soluções para a crise não se deu apenas pelo mercado, mas pela geopolítica e pela guerra. E a luta para controlar recursos energéticos foi fundamental no período 2011-2012, em que os EUA voltou a adotar estratégias de ofensiva militar na Líbia e na Síria. O controle do petróleo na Líbia foi peça chave para a redução do preço do petróleo que favoreceu o barateamento dos custos de produção nas economias centrais e ajudou na recuperação econômica dos EUA. Mas esse equilíbrio era instável. Isso porque a concorrência capitalista se intensificou depois de 2008, e a instabilidade no grande Oriente Médio tornava todo o sistema incerto. A descoberta do Pré-sal no Brasil e as reservas na Venezuela se colocaram como uma grande alternativa, comparada ao instável Oriente Médio. Assim, ampliar o controle sobre o petróleo e recursos naturais exigiu uma postura mais agressiva do Imperialismo dos EUA, que se voltou para a América Latina.
Outro fator fundamental, o Investimento Estrangeiro Direito (IED) no Brasil foi aplicado em dois ciclos. O primeiro do petróleo e extrativismo, no período 2007-2010 basicamente, e o segundo em comércio e serviços, durante os megaeventos (2011-2014). O capital estrangeiro fez uma série de exigências por garantias de seu retorno para se transferir para América Latina. E os governos da região deram. No Brasil, foi criado um Estado de Exceção para garantir os investimentos: isso fez parecer que a taxa de lucro estava garantida. Entretanto, um fator afetou bastante esse quadro: as lutas grevistas aumentaram concomitantemente à presença do capital estrangeiro, de modo que os trabalhadores conseguiram contínuos aumentos acima da inflação. Certamente, não foram aumentos estrondosos. Porém, acima do que era aceitável pelo arranjo. Nesse sentido, o PT demonstrou uma frágil capacidade de controle das greves e o aumento da massa salarial induziu a perda de vantagem comparativa, e este é um dos fatores que está na base da fuga de capitais ocorrida em 2014, que coincide com o início da crise política no bloco do poder.
Com essa fuga de capitais, a balança comercial desfavorável pela queda do preço das commodities e a grande renúncia fiscal realizada para salvar o capital da crise, o Estado estava em déficit e a economia em recessão. A crise alcançou o Brasil de forma estrutural.
A fuga de capitais minou o bloco no poder por dois motivos: 1) provocou um realinhamento do imperialismo, com os EUA diminuindo a margem de tolerância para divergência em relação a seus interesses, e atacando pela concorrência os países dos BRICS e governos que lhe tinham sido altamente favoráveis (como o do PT); 2) fatores de ordem política e ideológica interna aceleraram a ruptura nesse bloco e criaram a ocasião para a ofensiva burguesa e a tentativa de golpe institucional.
A mudança da política dos EUA foi resultado da crise mundial e da sua necessidade de se apropriar de forma ainda mais agressiva de recursos e valores. Mas esta tentativa de golpe não seria possível sem o papel ativo e passivo do PT. Por isso analisaremos a composição e ruptura do bloco no poder.
2.2. Composição e crise do bloco no poder
A crise na América Latina no final dos anos 1990 se intensificou e com ela também as mobilizações que serviram para chegada ao poder de governos de esquerda, como Chávez na Venezuela, Kirchner na Argentina, Evo Morales na Bolívia, Rafael Correa no Equador, além da eleição da Frente Ampla no Uruguai. No Brasil essa conjuntura internacional favoreceu a construção do bloco no poder que levaria ao poder Lula (PT). O PT participou da construção da aliança entre a indústria e o agronegócio, fortemente afetada pelas políticas neoliberais iniciadas no governo Sarney, mas executadas de fato no governo Collor, Itamar e Fernando Henrique Cardoso.
Esse bloco não se construiu em contraposição à hegemonia financeira, mas com sua manutenção. Nesse sentido, é importante destacar que a construção do bloco no poder efetivado com a eleição da chapa composta por Lula (ex-operário e líder sindical, fundador do PT e da CUT) e José Alencar (Importante empresário do ramo têxtil), foi concretizado com a reunião entre FHC e os diversos candidatos a presidente em 2002, onde se acordou o respeito aos empréstimos financeiros internacionais, e a Carta ao Povo Brasileiro onde se deixou claro a política de conciliação a ser construída pelo “Lulinha Paz e Amor”.
A composição do primeiro ministério do governo Lula-Alencar (PT-PR) foi representativo do bloco construído a parti da aliança indústria-agricultura. Para o ministério da Indústria Luiz Fernando Furlan, para Agricultura o representante do agronegócio, Roberto Rodrigues, e para o ministério do Trabalho representante cutista, Jaques Wagner. Materialização na composição dos ministérios da conciliação de classes da Era PT.
Como desdobramento da construção do bloco no poder, o primeiro ano do governo Lula foi marcado pela construção da concertação (pacto) através do Conselho do Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), um conselho tripartite (empresas-Estado-sociedade civil), de onde se acordou e encaminhou as primeiras medidas de reformas neoliberais, como a reforma da previdência, e todas as questões relativas à reforma sindical e trabalhista, que levaram a legalização das Centrais.
Dessa maneira a aliança entre a indústria-agricultura foi a aliança entre a aristocracia operária do principal subgrupo operário, os metalúrgicos do ABC, a indústria automotiva e toda cadeia do agronegócio. O Estado, por meio do CDES e do Ministério do Desenvolvimento Industria e Comércio, construiu políticas atendeu a demandas industriais vindas da FIESP e de outras entidades empresariais, como ANFAVEA e ABIMAQ, e do setor do agronegócio, beneficiado também pela conjuntura internacional. Dessa maneira, a política de estímulo à produção e consumo do Carro Flex, principalmente no segundo governo Lula, levou ao aumento tanto da produção, produtividade e de pessoas empregadas no setor, como também beneficiou amplamente o setor álcool energético.
Internamento o governo avançou os grandes projetos de infraestrutura interligados ao IIRSA dando origem ao PAC, que foi um processo de reestruturação da estratégia de acumulação do capital nacional e estrangeiro. Os investimentos do PAC foram direcionados para atender os setores internacionalizados da indústria (Petrobras, Vale do Rio Doce), infraestrutura energética (capital estatal) e capital nacional (grandes empreiteiras e certos setores da indústria de transformação) que sinalizam com a ampliação dos investimentos. O PAC foi estruturado para servir e dar suporte à indústria de transformação no Sudeste, à indústria energética e ao agronegócio, vinculado tanto à primeira como à segunda, atingindo as comunidades quilombolas, indígenas, ribeirinhas e camponesas. Favorecendo como sempre as grandes empresas nacionais, como Odebrecht, Camargo Correa, OAS, Votorantim e Gerdau, ou seja, favorecendo os interesses dos empresários em detrimento dos interesses do povo pobre.
A luta pela terra retrocedeu e poucas terras foram homologadas. O PT se aliou ao agronegócio consolidando uma aliança pelo desenvolvimento do setor, fundamentalmente para manutenção do crescimento econômico na era Lula. Dessa maneira, essa aliança abdicou de qualquer política de distribuição de terra, e direcionando para sua base um aumento de crédito agrícola e de alguns programas para a chamada “Agricultura Familiar”. Dessa maneira, o governo assentou menos sem-terra do que o governo FHC. O PT manteve as privatizações da estrutura produtiva que não foram revertidas e avançou na privatização da estrutura de circulação de mercadorias e pessoas (rodovias, ferrovias, hidrovias e aeroportos).
O desenvolvimentismo neoliberal petista foi onde se pregou a aliança deste bloco no poder. A crise econômica de 2008 aproximou ainda mais os industriais e a CUT-PT, que passaram a organizar mobilizações e atividades conjuntas (tal como a marcha convocada pela FIESP, ABIMAQ, Força Sindical e CUT, realizada em 18/10/2011). Por outro lado, a CUT e o PT sabotavam as lutas e greves das trabalhadoras e trabalhadores. No entanto, as greves passaram a acontecer à revelia das direções sindicais e partidárias, como em Jirau e Santo Antônio, e as emblemáticas greves dos professores do RJ de 2013, a onda de greves de rodoviários em 2014 e dos garis de 2014.
Para garantir esse desenvolvimento capitalista e a aliança o PT-CUT teve um papel ativo na construção do Estado de Exceção, do desenvolvimento do Estado Penal-Policial, onde segundo sua própria propaganda conferiu cada vez mais poder e aumento o efetivo do Judiciário e das forças de repressão.
O setor do Estado “fortalecido” pelo PT foi o ligado a judicialização-repressão. Justamente aqueles com os maiores níveis salariais, quando comparados aos demais servidores, e que hoje compõe as forças tarefas de caça ao próprio PT. Houve um crescimento do “Estado Penal”, e não do “Estado Social”, ou seja, cresceu o “Estado” que investe na judicialização e militarização, que está associado ao projeto estratégico de favorecimento do Capital.
A política do governo diante do levante de 2013 foi de aumentar a perseguição e prisão de atividades e manifestantes, bem como a criminalização das lutas sociais. O PT tomou para si a defesa da República Burguesa, quando a República Burguesa é da burguesia, ou seja, um instrumento social de geração de desigualdades e controle social policial, portanto um empecilho a construção do socialismo. A política petista não só reorganizou o aparelho de Estado dentro do neoliberalismo como buscou a construção de uma unidade burguesa. Neste sentido, o cenário internacional e o crescimento econômico possibilitaram o desenvolvimento e avanço de transnacionais de origem brasileira com financiamento dos fundos de pensão, controlado por sindicalistas, e do BNDES.
A repressão e a violência nas favelas e periferias, principalmente contra a juventude negra, não arrefeceu nem um pouco, pelo contrário. O Estado penal e policial cresceu a cada dia assassinando jovens negros nas favelas e periferias por todo o país. Tal como os recentes massacres da Cabula, na Bahia, os assassinatos e fuzilamentos na Maré e favelas cariocas, bem como a chacina ocorrida no bairro Curió em Fortaleza-CE. Os assassinatos no país, fundamentalmente nas favelas, periferia e nos campos, somam 50 mil por ano.
A política é de aumento da repressão e da criminalização do movimento popular. Além disso, o programa do PT para as eleições de 2014 propunha a nacionalização das UPPs. Presos políticos se somam no Rio de Janeiro[2] (Rafael Braga), São Paulo (Fabio Hideki), Goiás (os 18 estudantes[3], Valdir e Luiz Batista[4]) e Rio Grande de Sul[5] (Vicente Metz). No caso do Rio Grande do Sul a brigada militar do governo do PT de Tarso Genro seguidas vezes invadiu a sede da Federação Anarquista Gaúcha (FAG).
Os aparatos estaduais de repressão estão se unificando sob o comando do Exército. Para conter possíveis distúrbios no campo e nas grandes obras foi criada, em 2004, a Força Nacional de Segurança, vinculada diretamente ao Ministério da Justiça. O governo do PT reestruturou e iniciou o reequipamento das Forças Armadas, lidera tropas de ocupação no Haiti que explora e oprime cotidianamente o povo haitiano, com diversos relatos de exploração sexual por parte dos soldados brasileiros contra mulheres e crianças haitianas, e agora na Maré (RJ). Para isso, reorganizou as forças armadas com base na Estratégia Nacional de Defesa (END) determinado pelo governo Lula em 2007. Disso deriva toda reorganização das Forças Armadas no Brasil com deslocamento de tropas do sul para centro-oeste e norte, reequipamento e reativação da indústria bélica nacional. Dentro do quadro de reorganização foi formado o Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas (EMCFA), órgão vinculado ao Ministério da Defesa, que após o Levante de Junho de 2013, elaborou o “Manual de Garantia da Lei e da Ordem” onde colocou os movimentos sociais como “forças oponentes”.
Para coroar a construção do Estado de Exceção e garantir os lucros da burguesia, principalmente durante os megaeventos, o Ministério da Defesa elaborou, logo após o manual “Garantia da Lei e da Ordem” (GLO) como forma de legitimar oficialmente a perseguição política, a violência policial e o terrorismo de Estado. Para garantir a realização da Copa e os lucros da FIFA o governo editou a Lei Geral da Copa que criminalizou as formas de luta dos trabalhadores como as greves e manifestações de rua que ocorressem no período dos megaeventos, além da Recopa (Regime Especial de Tributação para Construção, Ampliação, Reforma ou Modernização de Estádios de Futebol) que garantiu que nenhum controle a da sociedade civil pudesse ser estabelecido sobre os gastos e empresas que depois estariam envolvidas nos escândalos de corrupção. A “Lei antiterrorismo”, um dos últimos atos da presidente Dilma/PT, não é nada mais que a ação do Estado e da classe dominante contra as trabalhadoras e trabalhadores. É a legitimação de um Estado de exceção sobre as organizações e ações dos movimentos populares e sociais. A Lei Antiterrorismo é o “AI-5 da democracia”.
A burguesia foi uma das maiores beneficiárias das políticas petistas, fato assumido pelo próprio Lula, enquanto para os trabalhadores o governo criou uma série de programas de atendimento social para combater a miséria extrema e aumento do salário-mínimo, sem reverter a desigualdade econômica do país. Tal situação levou ao boom do consumo individual, facilitado pelo crédito e cenário internacional, com alta do preço das commodities, que favoreceu o crescimento econômico nacional. Esse crescimento baseado também em megaprojetos que afetam milhares de pessoas da população rural e urbana, aumentando os desastres ambientais devido ao modelo de desenvolvimento assumido pelo PT, sendo o desastre de Mariana provocada pela Samarco, joint-venture formado pela Vale e BHP, o caso mais emblemático.
Assim, durante o governo Lula tivemos uma grande concentração de capital, principalmente no setor financeiro e agrícola, bem com a política do governo federal de formação das grandes multinacionais brasileiras e da sua internacionalização. No período da crise internacional há um aumento das operações de financiamento via Estado às grandes empresas. Assim, o Estado sob gestão do PT aprofundou uma tendência de um intervencionismo concentrador.
Em nenhum momento o PT atacou os setores conservadores, sempre realizou concessões a direita. O exemplo mais claro disso, são as eleições de 2014, a agenda Brasil de 2015 e o Ajuste Fiscal iniciado em 2015 e que pelo governo Dilma se estenderá até o fim de seu mandato. Para vencer o segundo turno das eleições presidenciais se utilizaram da insígnia “Dilma Coração Valente” para designar uma virada a esquerda do próximo governo petista. No entanto, consolidada a vitória eleitoral e diante de um quadro de crise econômica e política decorrente dos escândalos de corrupção os primeiros ministérios do segundo mandato Dilma Rousseff foram compostos por representantes do Agronegócio (Kátia Abreu), setor financeiro (Joaquim Levy) e das alianças estabelecidas com PMDB. As primeiras medidas anunciadas foram de ajuste fiscal e reformas que atacam os direitos das trabalhadoras e trabalhadores.
É importante observar que foi nesse momento que ocorreu Junho de 2013. A grande insurreição popular mostrou definitivamente a incapacidade do PT de controlar as lutas e movimentos sociais. E depois das eleições 2014, a oposição burguesa-conservadora liderada pelo PSDB, lançou uma ofensiva de desestabilização do Governo Dilma, com apoio dos EUA (tendo em vista que os recentes apoios dos EUA em derrubadas de governos na Ucrânia, Síria ou abertamente como no Iraque). Ao mesmo tempo, iniciou-se uma decomposição interna na base do Governo, com a oposição dentro do PMDB liderada por Eduardo Cunha. O PT poderia ter nesse momento, mais uma vez, atacado esses setores. Mas a campanha contra Cunha terminou com uma tentativa de conciliação orquestrada pelo próprio Lula ainda em 2015.
Em meio a toda a crise o partido procurou o tempo todo costurar suas alianças por cima angariando apoio dos setores conservadores, inclusive de cunho religioso, em troca de apoio parlamentar e eleitoral, tentando se manter no bloco no poder. No entanto, os desdobramentos da crise política e da ação judiciário por meio da Procuradoria-Geral e do judiciário, a crise econômica, a política recessiva do governo Dilma e o descontrole da CUT e do PT das lutas sociais que pipocam nas bases estudantis e de movimentos sociais parecem ter determinado a posição burguesa de romper o bloco no poder.
A burguesia se lançou à ação de massas, coordenada com o poder judiciário e policial ultra- centralizado e fortalecido pelos governos do PT, usando esses instrumentos criados e fortalecidos pelo PT contra ele mesmo. Essa ação de massas, combinada com a cisão parlamentar e o uso do poder judiciário, consolidaram a decomposição do bloco no poder com saída progressiva da indústria (FIESP), da agricultura (Bancada Ruralista) e outros setores.
2.3. O ano de 2017… as contrarreformas avançam.
Desde o início do governo Temer e frente ao contexto de ataque geral aos direitos do povo (PEC 55, PL 257, reforma da previdência e trabalhista, reforma do ensino médio, etc.) se discutia duas alternativas: a construção da greve geral e a radicalização da luta ou a convocação de novas eleições ou impeachment para retirar Temer (PMDB) da presidência. Diante da consolidação do governo Temer com apoio da Burguesia e dos oligopólios dos meios de comunicação até os setores reformistas tiveram que apostar na greve geral, que aconteceu no dia 28 de abril de 2017
Depois da greve geral e da imensa mobilização do dia 28 de Abril com boa adesão e grande apoio contra as reformas neoliberais, novamente o sindicalismo socialdemocrata e de Estado (CUT, Força Sindical, CTB, UGT, CSB, NCST, CSP-Conlutas, Intersindical) e os grandes e pequenos partido do bloco socialdemocrata/comunista (PT, PCdoB, PSOL, PSTU, PCB, PCO, MAIS, NOS) retomaram a bandeira de “esquerda” das eleições gerais e abandonaram a luta contra as reformas e a greve geral já pelas “diretas já”. Ainda no dia 24 de maio se conseguiu uma grande mobilização em Brasília que levou a intervenção militar e o conflito entre o poder legislativo e judiciário. Salvo a CSP-Conlutas, as demais centrais se prestaram a criminalizar a luta e continuar a desmobilização apostando no caminho da negociação. Se dirigem assim a salvar a democracia burguesa e suas disputas palacianas. Isso só conduzirá o povo a derrota, desviando do foco da real e necessária luta pelo arquivamento das contrarreformas de tipo neoliberal em curso desde o governo do PT.
Tivemos assim, uma radicalização da luta de classe a confirmação de um cenário cada vez mais certo de estado de exceção. O bloco burguês-conservador resolveu caminhar para um recrudescimento das políticas neoliberais que significará o empobrecimento e a perca de direitos do povo brasileiro. Para isso, aumenta a escalada de violência e a generalização do terrorismo de Estado, ao mesmo tempo em que o bloco socialdemocrata tenta manter os protestos dentro da legalidade e sabotar a agitação de massas, se posicionando ainda como um partido da ordem. Surgindo setores combativos dentro desse bloco, liderado pelo PT e PCdoB através das suas frentes: Povo Sem Medo e Brasil Popular. Não por acaso a reunião das centrais logo após o 28-A e o primeiro de maio definiu uma “ocupação” domesticada, sem greves e paralisações, em Brasília, e negociação com parlamentares e forças policiais. Substituindo a ação direta e toda luta coletiva dos trabalhadores pela negociação burguesa nos gabinetes da Esplanada dos Ministérios.
Com o 28-A e 24-M se agudizou duas contradições importantes 1) a luta contra a burguesia, o terrorismo de Estado, o PMDB e as reformas neoliberais; 2) a luta contra a burocracia sindical e o reformismo. No entanto, diante do conflito interno na Burguesia e no aparato de Estado os setores reformistas voltaram a clamar por eleições diretas, enquanto a burguesia e os oligopólios de comunicação se dividiram entre: acreditar no governo Temer, eleições indiretas e eleições diretas.
A estratégia do bloco socialdemocrata, mesmo diante do terrorismo de estado e do Estado Exceção, alimentando por eles durante mais de uma década, é garantir a legalidade burguesa para as disputas eleitoras, promovendo greves que não tenha nenhum impacto real na acumulação de capital no Brasil. E depois dirão que greve geral foi “sem efeito”, que as massas não estão “preparadas”. Essa estratégia derrotista é uma estratégia oportunista, visa apenas preservar a burocracia sindical e realizar o trabalho de apoio a campanha “Lula 2018”. Tal situação ficou evidente diante do desmonte da greve aprovada para o dia 30 de junho que foi um fracasso. Desta maneira o Bloco liderado pelo PT e CUT lançaram a Caravana de Lula pelo Nordeste para catapultar sua candidatura e politizar as acusações da Lava Jato.
2.4. A composição de classe, organizativa e ideológica dos blocos
Por fim, para compreender a crise no bloco do poder é preciso compreender minimamente a composição de classe, organizativa e ideológica. O PT confundiu o fato de ter sido integrado num bloco de poder, essencialmente histórico, isto é, transitório, com a ilusão de ter sido integrado à classe dominante. A crise do bloco no poder mostra que o alinhamento conservador (burguesia nacional, capital estrangeiro-imperialismo) não comporta mais representantes setores de uma pequena-burguesia reformista e da aristocracia operária. A exclusão do PT do bloco no poder é apenas o primeiro passo de uma grande ofensiva contra a classe trabalhadora, ofensiva esta que não teria sido possível sem o papel cumprido pelo PT.
O bloco burguês-conservador tem uma composição distinta em termos de classes sociais do bloco socialdemocrata. É fundamental compreender tais diferenças. Do ponto de vista de classes, o bloco burguês conservador é composto pela grande burguesia industrial, agrária e financeira (a ruptura da Bancada Ruralista e da FIESP com o governo, bem como o apoio de diversas empresas ao impeachment mostra essa unidade); ela também conseguiu integrar uma pequena burguesia raivosa, especialmente em razão deste último setor ter sido arruinado pela crise de 2008 e pela concentração de capital promovida pelo modelo econômico do PT.
Mas esse bloco tem mobilizado muitos trabalhadores, especialmente servidores públicos de governos diversos que tem o PT como patrão (nas prefeituras e governos estaduais). Esse último setor entra como força de apoio e não tem compreensão de que o bloco burguês-conservador prepara um grande ataque contra os seus interesses. Do ponto de vista ideológico, o bloco burguês-conservador é adepto do pragmatismo, mas comporta desde tendências neoliberais até grupos fascistas de extrema direita. A unidade deste bloco é frágil; caso ele consiga derrubar o governo do PT ele tende a perder grande parte de suas forças de apoio de trabalhadores e mesmo da pequena-burguesia.
Por sua vez, o bloco socialdemocrata-governista é composto por uma pequena-burguesia (pequenos e médios empresários desenvolvimentistas), por uma aristocracia operária e sindical e por uma tecnocracia de empresas estatais e bancos. Entram como forças de apoio trabalhadores rurais-camponeses, massas urbanas e assalariados precarizados. A contradição é que esses setores de apoio foram atacados pela política econômica e compromissos do PT enquanto este estava integrando o bloco no poder. E na realidade, para que o PT não seja derrubado, ele terá de assumir o compromisso de atacar não somente este último setor, suas forças de apoio, mas sua própria base social, a aristocracia (servidores públicos federais, funcionários das grandes empresas estatais, operários das grandes empresas industriais). Alguns exemplos de ataques a esses setores já estão em curso: o PPE e reforma fiscal que prevê inclusive demissão voluntária e congelamento salarial no serviço público, setor “intocável” até então nos discursos governistas. Ideologicamente, esse bloco é hegemonizado pela ideologia socialdemocrata, cada vez mais democrata-liberal, daí sua crença na democracia como valor absoluto e sua dificuldade para romper com o legalismo mesmo quando esta legalidade não significa nada.
Nesse sentido, apesar de a polarização estar conduzindo o proletariado às ruas, nenhum dos blocos tem em seus respectivos programas soluções para os problemas materiais das forças de apoio que mobilizam. As classes sociais e grupos que participam nele estão sendo dirigidos por blocos socialmente e ideologicamente heterogêneos e sem uma base programática que dê coesão duradoura aos mesmos.
A luta e crise do bloco no poder parece criar condições para que essas classes-apoio se desprendam dos seus respectivos blocos dirigentes quando ficar claro que estes não resolverão suas necessidades materiais e aspirações sociais. É para este momento que precisamos estar organizados e em condições de intervir em escala nacional.
2.5 A agudização da luta de classes: cenários e estratégias de resistência
O Brasil vivencia a ascensão de um setor ultrareacionário. Mas é preciso distinguir o setor ultrarreacionário da direita do PMDB/PSDB (as Bancadas da Bíblia, da Bala e do Boi), de grupos menores, fascistas ou ultraliberais (que emergiram sob o manto do MBL e Vem para Rua). A fascistização é, assim, um aspecto da nova guerra fria. Esse setor ultraconservador no Brasil é retroalimentado pela tendência de polarização internacional, mas tende a ser pouco duradoura.
Não podemos ignorar que existe um processo de fascistização em curso. Mas também não podemos mistificá-lo. Há uma limitação material para expansão do fascismo em um país periférico: o fascismo cresceu cooptando grande parte da classe trabalhadora ao conceder participações significativas no poder de Estado e nos lucros da acumulação. Aqui, além das bravatas e dos preconceitos, o fascismo não tem muito a oferecer, dificilmente se constituindo como movimento de massas. O único setor que está na base ultraconservadora, que conjuga base de massas com alguma ação econômica, são as igrejas neopentecostais, mas, mesmo assim, isso tem limites. Por isso, combater o fascismo é, antes de qualquer coisa, erodir sua base social, ao explicitar a contradição econômica dos seus líderes, que não tem anda a oferecer, e suas bases, que tem tudo a perder com a política destes.
O fascismo tem sido usado pelo reformismo como parte da estratégia do medo: para combater o fascismo, supostamente, é preciso abdicar de formas de luta e se aglutinar em torno das organizações reformistas. Mas o reformismo, fortalecido, enfraquece a resistência de classe, e é na ausência dessa que o fascismo cresce. Por isso, só existe uma genuína saída ao processo de fascistização: o duplo combate ao fascismo e reformismo. E para combater os dois é preciso a auto-organização da classe trabalhadora.
Decorre desta análise o estabelecimento de uma linha de ação. Devemos saber que uma linha revolucionária não terá de imediato o impacto e adesão de amplos setores, exatamente porque estão presos às ilusões criadas pelo bloco de poder em crise. Mas conforme a crise do bloco do poder se aprofunde ou se resolva, e a tentativa de golpe institucional se consolide ou recue para um compromisso, esta situação se transformará aceleradamente.
Nesse sentido devemos fixar dois pressupostos:
1 – Nenhum apoio à defesa democracia liberal ou da “constituição”, ou transigência com a oposição burguesa-conservadora. Isso seria capitular ideologicamente. Por isso, a palavra de ordem frente à crise deve ser a de: “Não temos uma democracia a defender, temos um Estado de exceção e ajuste fiscal a combater”
2 – Não podemos confundir os setores do bloco de poder entre si (o bloco burguês-conservador é distinto do bloco socialdemocrata), e menos ainda as classes e forças de apoio com seus núcleos dirigentes; precisamos saber que as contradições materiais entre as classes irão se impor e dissolver a unidade interna dos blocos. É preciso disputar esse processo, tendo uma linha de massas independente.
Tomando então essa política, nos colocamos no campo da oposição revolucionária, e não da adesão a um dos dois blocos em luta. Hoje dois cenários se colocam ante a tentativa de golpe institucional, que podem te diferentes respostas de cada bloco.
Desse modo, em todos os cenários a unidade interna dos blocos tende a entrar em crise. O único fator certo é que ocorrerá um amplo ataque em todos os níveis aos trabalhadores e recursos públicos. Estes cenários podem na hipótese menos pessimista, manter o regime, e em situações extremas generalizar o autoritarismo e o Estado de Exceção, resolvendo assim em favor deste último a dualidade (democracia x Tirania) constitutiva do sistema político brasileiro
Por isso hoje não podemos nos deixar capturar pela polarização. Não podemos cair no discurso da defesa abstrata da “democracia”, pois isso implicaria em desorganizar o trabalho preparatório de resistência (ideológico e organizativo) necessário ao enfrentamento da ofensiva que já está sendo realizada e será aprofundada quando a crise interna do bloco de poder se resolver. É necessário que os militantes tenham paciência história e persistência no trabalho de base diário.
A principal tarefa dos anarquistas, sindicalistas e marxistas revolucionários é ter uma séria política de organização e resistência de massas capaz de, no caso do cenário 1, criar formas organizativas autônomas que não permitam que o bloco socialdemocrata canalize exclusivamente para as eleições 2018 a ação e massas; e no caso do cenário 2, capaz de combater o papel desorganizador que o governismo terá de cumprir para garantir a presença do PT no bloco do poder, de forma a contribuir para que o movimento de massas seja ao mesmo tempo capaz de enfrentar a repressão e realizar lutas reivindicativas.
Programaticamente é preciso contrapor as palavras de ordem: 1) Nem Impeachment, que implicaria defender um governo do PMDB; 2) Nem a defesa do Governo do PT e da democracia; 3) Nem de eleições Gerais Já, que interessa à oposição burguesa. Todas essas políticas apontam para solução por cima, ou pela esperança de que o Bloco Burguês-conservador resolva a crise; ou que uma nova entrada dos trabalhadores no bloco do poder, seja dirigida pelo PT, seja pelo PSOL, seria a alternativa. Nenhuma dessas políticas coloca no centro a ação das próprias massas.
Por isso, a nossa política deve ser colocar a centralidade na ação das massas. Esta ação de massas deve ser expressa pelo trabalho de agitação e propaganda em favor do Congresso do Povo. Sabemos que o Congresso do Povo não será construído de imediato nessa crise, mas as assembleias populares e conselhos, seus embriões locais podem (assim como em 2013 surgiram fóruns, assembleias etc.).
3 – Plano de lutas para o próximo período
Partindo dessa leitura crítica da conjuntura nacional e internacional o II ENOPES deve apontar um programa de luta e organização para o período de curto, médio e longo prazo.
O foco principal da luta de massas deverá ser a consolidação das organizações sindicalistas revolucionárias sob a forma de Federações Autônomas. A consolidação das organizações sindicalistas revolucionárias, assim, é um passo essencial. Nesse trabalho deveremos expandir o contato com novas organizações autônomas surgidas depois das lutas do período, convidando-as para integrar a construção do sindicalismo revolucionário do Brasil.
O processo de organização do setor superexplorado e precarizado, com a difusão de formas mutualistas de associação e práticas de solidariedade econômica também serão outra ferramenta fundamental. Desse modo, é importante a construção de organizações cooperativas e mutualistas, sempre como aspecto da organização reivindicativa do sindicalismo revolucionário. Tais medidas de promoção do apoio são fundamentais para enfrentar as ofensivas neoliberais e reformas em curso, que tendem a aprofundar a pobreza e miséria.
Além disso, manteremos os dois eixos principais das nossas campanhas de agitação e propaganda: a campanha pela Greve Geral e Todo poder ao Congresso do Povo; a campanha Não Vote: Lute! Nesse atual contexto, a palavra de ordem de uma greve geral insurrecional será o contraponto da campanha Lula 2018, assim como a própria campanha Não Vote: Lute! Desse modo, iremos lançar a construção de Comitês ampliados da campanha Não Vote Lute, como forma de contrapor a Campanha Lula 2018. Esses comitês devem funcionar, antes e depois das eleições, como comitês de construção da greve geral.
Um segundo ponto fundamental do Plano de Lutas é a construção internacional. A CNT (Espanha), USI (Itália), FAU (Alemanha) e FORA (Argentina) apontaram para um importante processo de ruptura com o revisionismo e uma autocrítica necessária do afastamento das massas, que teve adesão recente da IWW (EUA). Realizaram um chamado à reconstrução da AIT que pode se tornar um importante espaço de articulação internacionalista. Nesse sentido, o II ENOPES resolver orientar a participação crítica nesse processo, com a defesa dos princípios do sindicalismo revolucionário, mas visando a estruturação imediata de uma Associação Internacional dos Trabalhadores.
RESOLUÇÕES:
Nesse sentido devemos fixar dois pressupostos:
A – Nenhum apoio à defesa democracia liberal ou da “constituição”, ou transigência com a oposição burguesa-conservadora. Isso seria capitular ideologicamente. Por isso, a palavra de ordem frente à crise deve ser a de: “Não temos uma democracia a defender, temos um Estado de exceção e ajuste fiscal a combater”.
B – Não podemos confundir os setores do bloco de poder entre si (o bloco burguês-conservador é distinto do bloco socialdemocrata), e menos ainda as classes e forças de apoio com seus núcleos dirigentes; precisamos saber que as contradições materiais entre as classes irão se impor e dissolver a unidade interna dos blocos. É preciso disputar esse processo, tendo uma linha de massas autônoma.
Por sua vez as tarefas imediatas são:
1) Fortalecer uma linha política classista e combativa em espaços de organização da classe já existentes, tais como assembleias sindicais, DCEs, CAs, grêmios estudantis, associações comunitárias, grupos de mídia etc. Apesar da burocratização sindical que serve na maioria dos casos como desorganizador dos interesses da classe trabalhadora, ainda é um espaço reconhecido por um grande setor. É necessário combater a burocracia sindical e partidária e construir alternativas autônomas! A atuação dos setores combativos nesses espaços quanto mais organizada for tanto mais efeito terá para o fortalecimento de um bloco alternativo ao socialdemocrata e conservador, por isso, a importância de reunir os estudantes e trabalhadores dispostos a luta em organizações autônomas sindicalistas revolucionárias nos locais de estudo, trabalho e moradia.
2) Ajudar a preparar junto ao povo as condições para a resistência através de protestos de rua, ocupações e greves contra a retirada de direitos, contra os efeitos do ajuste fiscal e crise econômica. Organizar a autodefesa popular contra as formas de repressão policial-militar e criminalização que se aprofunda sobre a organização e ação do movimento popular e o povo em geral;
3) Não transigir com os governistas. Nos locais onde o movimento de massas está em refluxo, organizar a agitação e propaganda desta linha e deste comunicado através dos militantes e comitês de apoio do anarquismo revolucionário e dos comitês da campanha “não vote, lute”!
4) Participar e construir em todos os lugares que tiverem condições assembleias populares autônomas como organismos de contrapoder– fóruns abertos para dezenas, centenas e milhares de pessoas para a luta popular. Essas assembleias são o único espaço possível para criar aquilo que todos sabem que falta aos setores que vão para as ruas: consciência de classe de seus reais interesses. Essas assembleias populares devem ter como principal função organizar a resistência e luta contra o Estado de Exceção e o ajuste fiscal, que irão se aprofundar em qualquer dos dois cenários apontados acima.
5) Culminar todo o trabalho atual (que são as ginásticas locais e regionais de contra-poder), para a estratégia revolucionária de construção do Congresso do Povo. Mas o Congresso do Povo e as Assembleias Populares não surgem sem luta. O método hoje é a ação direta e a greve geral. As Assembleias Populares devem se colocar como tarefa lançar as massas a ação direta e construir a greve geral como principal estratégia de luta. Parar o Brasil, com a greve geral, para barrar o ajuste fiscal.
6) Do ponto de vista internacional participar da reconstrução da AIT liderada pela CNT (Espanha), USI (Itália), FAU (Alemanha) e FORA (Argentina). Construir as condições para participar como membro efetivo da AIT reconstruída.
[1] Segundo o BID (2016) quase 135.000 pessoas foram assassinadas em 2015 na América Latina e no Caribe e, segundo a CEPAL (2016) pobreza no continente aumentou no último período, atingindo cerca de 175 milhões de pessoas – 29,2% da população total da região – , sendo que 75 milhões seriam indivíduos vivendo em situação de indigência.
[2] No Rio de Janeiro ainda está em curso o processo política de criminalização e condenação dos 23 Presos Políticos.
[3] Dezoito estudantes foram presos em função das ocupações estudantis.
[4] Valdir e Luiz são lideranças do MST que foram presos acusados num processo que qualifica o MST como uma organização criminosa na chamada Lei das organizações criminosas ou Lei nº 12.850 de 2013 sancionada por Dilma/PT.
[5] Seis militantes do Bloco de Lutas de Porto Alegre foram convertidos em réus no processo que criminaliza as lutas de 2013 contra as máfias dos transportes.
Dessa situacao geral emerge as condicoes de reconstrucao de um sindicalismo revolucionario baseado na acao direta, autonomia e na defesa da greve geral. Aos camaradas e organizacoes populares nos quatro cantos do pais nos fazemos o chamado: levantar um novo movimento de massas! Assumir nossos postos de combate! Unir as forcas militantes do proletariado do campo e da cidade!