Por seção popular do Sindicato Geral Autônomo de Santa Catarina
No dia 7 de janeiro de 2021, participamos, junto a outras organizações e indivíduos, como apoio aos indígenas da etnia Kaingang na retomada da casa de passagem indígena temporária, localizada no Terminal de Integração desativado do bairro do Saco dos Limões (Tisac). A ação de resistência se deu devido ao não cumprimento da prefeitura com o acordo firmado de utilização do Terminal pelos indígenas enquanto não fosse construída uma casa de passagem permanente, que estava prevista para esse ano.
No início da manhã do dia 7 indígenas e seus apoiadores ocuparam o terminal, em pouco tempo a Polícia Militar e a Guarda Municipal foram acionadas, sendo que a última permaneceu no local realizando um cerco com o objetivo de impedir a entrada de mais pessoas, se valendo de ameaças de uma possível necessidade do uso da força se o terminal não fosse liberado. Durante o dia, se fizeram presentes representantes da Prefeitura, do Governo Federal (através da Funai – Fundação Nacional do Índio) na tentativa de exercer pressão para a saída dos indígenas, alegando desde questões legais a uma suposta preocupação com a saúde dos indígenas relacionada à questão do Covid 19.
Após muita tensão, os indígenas saíram vitoriosos e garantiram a permanência no espaço. No atual momento contam com a solidariedade de apoiadores para recuperar o terminal que estava depredado. O fato é que há anos o problema e o empurra-empurra entre a Prefeitura (através da Secretaria de Assistência Social) e o Governo Federal (Funai) persiste no que diz respeito a casa de passagem indígena. No plano de fundo está: o descaso com a população indígena no estado e a necessidade de subsistência econômica destes, que todo ano, nesta época, necessitam circular pelas cidades do litoral do estado para vender seus artesanatos para garantir assim parte significativa do sustento de suas comunidades.
“A gente já deixou conta para trás, a gente já veio trabalhar para fazer dinheiro para ir para lá, vocês sabem? Veio a pandemia e aí mais a estiagem. Plantou feijão, não colheu nada. Plantou milho, não colheu nada. Então, o nosso sobreviver é o nosso artesanato. E daí estão tão preocupados com o Coronavírus nesse local e nas praias tá livre. Isso deixa a gente indignado! A gente tá aí para respeitar as normas como tem que trabalhar, mas que deixassem a gente trabalhar. Se não tem lugar aqui, eu já combinei, nós somos um grupo grandinho, nós vamos para baixo do viaduto dormir. Nós não vamos incomodar ninguém. Não estamos pedindo nada, a gente apenas quer um lugar para trabalhar e a noite dormir.” (Transcrição de declaração de liderança feminina indígena durante diálogo com a Secretaria Municipal de Assistência Social e a Funai.)
O Covid 19 é o menor dos problemas, visto que a falta de locais adequados para receber as várias etnias indígenas que circulam pelo estado expõe crianças, jovens e adultos aos mais diversos riscos há anos. Como pode se atestar por dois, de muitos, infelizes episódios que ocorreram em nosso estado nos últimos 5 anos. Um deles é o brutal assassinato de Vitor Pinto, bebê de apenas dois anos, de família Kaingang que estava dormindo na rodoviária de Imbituba, litoral sul, cidade em que seus pais estavam para vender seus artesanatos e tiveram seu filho esfaqueado, por motivo de ódio, no momento em que era alimentado por sua mãe. Assim como com Marcondes Namblá, professor indígena da etnia Xokleng, morto a pauladas em Penha em 2018. Ele aproveitava o período de férias escolares para vender picolé no litoral norte como complemento à renda de sua família, quando foi cruelmente atacado com golpes na cabeça até a morte.
Para além do disse-me-disse entre as possíveis motivações pelas quais Prefeitura e Governo Federal buscam desocupar a casa de passagem temporária do Tisac, há uma questão estrutural que extrapola esse problema da falta de locais adequados para estadia. Dentro do sistema capitalista, os povos originários são jogados à margem e obrigados a encontrar formas alternativas de sobrevivência que não o cultivo da terra, que hoje além de ameaçadas pelo agronegócio, encontram-se devastadas pela estiagem. A verdade é que dentro do capitalismo, a população indígena está fadada ao desaparecimento, sendo necessária uma transformação radical da sociedade. Por isso é importante avançar em mais do que apenas ações defensivas, é preciso construir instrumentos organizativos junto à classe trabalhadora para enfrentar os ataques do Estado e do capital.
Toda solidariedade à luta indígena!
Pela construção de casas de passagem em todo o estado!
Pelo direito à terra para garantia do pão!