É atrativa a propaganda de que o Novo Ensino Médio (NEM) traz liberdade para os alunos escolherem o que estudar. Também seduz a promessa de uma educação diversificada e conectada com o cotidiano e que garanta um emprego. Afinal, o desemprego e a precariedade da educação básica no Brasil, sobretudo a pública, são desesperadoras; e melhorar as escolas é um anseio geral.
Porém, o NEM deve ser analisado para além dessas publicidades ideológica que governos e empresas fazem para vender seu “peixe”. Estes estão explorando o justo anseio por melhorias para nos empurrar goela abaixo uma reforma empresarial muito nociva. Estão romantizando um projeto que fere princípios da educação pública e universal, mas que é vendida como “progressista”.
A paternidade empresarial do NEM
O NEM é um projeto educacional elaborado por bancos e grupos empresariais nacionais e internacionais em parceria com governos. Alguns destes grupos nacionais são o “Movimento pela Base” e “Todos pela Educação”. Entre empresas entusiastas e financiadoras estão a Fundação Lemann, Instituto Ayrton Senna, Instituto Natura, Instituto Unibanco, Fundação Itaú Social, Fundação Roberto Marinho etc.
No plano internacional, o Governo Federal se submeteu a um acordo com o Banco Mundial (BM), contraindo uma dívida de 250 milhões de dólares para implantar o NEM. A liberação deste recurso está condicionada ao cumprimento de metas definidas pelo Banco até 2023, como identificação de especialistas e reformas curriculares nos estados. O Banco Mundial é uma instituição imperialista que “orienta” países periféricos a adotarem políticas neoliberais, oferecendo financiamento e assessoria técnica, como ocorre com o NEM.
Para exemplificar sua política, em documento intitulado “Um Ajuste Justo…” de 2017, o Banco Mundial defende que o Brasil reduza seu investimento em educação e o número de docentes, aumentando assim a quantidade de alunos por professor em sala. Uma tática para isso seria aproveitar o “declínio natural do número de professores, sem substituir todos os profissionais que se aposentarem no futuro”. Esta “recomendação” sinaliza seu caráter antipovo, neoliberal e imperial.
No teste de paternidade, o NEM está impregnado do código genético desta elite brasileira e mundial. Uma elite que é parte dos problemas do mundo, das nossas desigualdades e injustiças, e que pensa e age também a nível educacional para formar uma força de trabalho adaptada a suas novas formas de exploração e que aceite seu poder: este é o projeto de sociedade que o NEM vai servir.
Antecedentes e contexto da reforma
É preciso pontuar que o NEM tem, pelo menos, três antecedentes institucionais que o pavimentam, atravessando diferentes governos – Dilma, Temer e Bolsonaro:
- A) em 2009, o Programa Ensino Médio Inovador (ProEMI) serviu de laboratório para induzir uma reestruturação curricular, também orientada pelo Banco Mundial;
- B) em 2014, o Plano Nacional de Educação (PNE 2014-2024) apontava em sua Estratégia 3.1 a flexibilização curricular com conteúdos obrigatórios e eletivos, hoje presentes no NEM;
- C) em 2015, o início da elaboração da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada em 2017 e 2018, foi fruto do lobby e aposta do mercado educacional para investir com previsibilidade e segurança econômica nos produtos do ramo. A BNCC está no tripé do NEM.
Em 2016, enfim, o presidente Temer instituiu a Medida Provisória 746 da “reforma do ensino médio”. Como reação, mais de mil escolas e universidades no país foram ocupadas pelo Movimento Estudantil contra a Reforma: uma resistência histórica! Apesar da luta, a reforma foi aprovada em 2017 com algumas dissimulações – como Lei 13.415.
A educação não é uma ilha isolada. Assim, devemos entender que a nova formação pretendida no NEM serve a um contexto econômico específico. Entre 2016 e 2019, um conjunto de outras reformas ultraliberais foram propostas ou sancionadas por Temer e Bolsonaro, como: a EC 95, que congelou por 20 anos o orçamento da União; a Lei da Terceirização ilimitada (Lei nº 13.419); a Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467); a Reforma Previdenciária, entre outras.
Vejamos a EC 95 em relação ao NEM: em vez de ampliar recursos, já que o NEM pretende ampliar a carga horária e “inovar” o currículo, a EC 95 limita investimentos públicos. Tal corte de verba criar uma forte carência; por outro lado, o NEM abre a possibilidade legal de parte do currículo da rede pública ser executado pelo setor privado. Criam o problema, precarizando o serviço público, e apresentam a “solução” milagrosa da privatização.
Estas reformas antipopulares e o quadro econômico reforçam o contexto para o qual o NEM é justificado. Sob o pretexto de um ensino “flexível, em diálogo com o setor produtivo e demandas do século XXI”, o NEM pretende formar estudantes adaptáveis à flexibilidade do mercado de trabalho: longos períodos de desemprego, empregos rotativos, precários, sem direitos trabalhistas, sem estabilidade e com baixa remuneração. Eis a realidade do século XXI para a qual o NEM pretende formar nossa juventude.