Este texto foi retirado do jornal CNT nº 423 (abril-junho de 2020), órgão de propaganda Confederação Nacional do Trabalho (CNT) da Espanha. Neste texto os camaradas da Federação Operária Regional Argentina (FORA) abordam o processo de reorganização recente da federação, os desafios e características desse processo em terras argentinas. Em 2017 uma delegação da FORA esteve no Brasil participando do encontro nacional da FOB.
A Argentina sofreu uma grande mudança com o passar do milênio, e 2001 funcionou como um divisor de águas que expôs a crise social que formou o modelo neoliberal imposto desde a última ditadura militar, em 1976, e aprofundado pelo governo Menem nos anos 90. Após a explosão social no final de 2001, as duas décadas seguintes mostraram uma importante renovação na atividade política dos setores populares, incluindo a sindical.
Foi neste contexto que a FORA iniciou um processo de revitalização de suas atividades. Durante as últimas décadas ela havia mantido uma expressão mínima graças à permanência de uma camada de velhos militantes, mas que não estavam mais inseridos na atividade de trabalho. Junto com a crise social, foi produzida uma busca por alternativas políticas e econômicas para enfrentar esta situação, revitalizando um interesse geral nas idéias anarquistas. Entretanto, isto não significava que o anarquismo tivesse canalizado ou dirigido este processo social, mas que tinha imbuído seus valores solidários e combativos, e sua metodologia organizacional horizontal, em uma ampla gama de iniciativas populares promovidas na época (cooperativas, assembleias de bairro, ocupação de fábricas e terras, organizações de desempregados, etc.).
Uma geração de jovens libertários com pretensões de atuar dentro do movimento operário foi atraída pelo legado da FORA e assumiu a tarefa de reavivar essa referência dentro da esfera sindical. A brecha geracional entre os militantes mais jovens e os mais velhos mostrou a falta de ferramentas para conseguir um impacto significativo nesse ambiente sindical burocrático e complacente. Para isso, foi feita uma tentativa de organizar núcleos inter-sindicais, as chamadas Sociedades de Resistência de Ofícios Vários, a partir das quais é possível trabalhar e discutir livremente as estratégias a serem utilizadas em cada área de trabalho em que os militantes estavam ocupados, oferecendo solidariedade imediata frente a algum conflito. Ao mesmo tempo, as sociedades de resistência agiram e estão agindo como grupos de propaganda que denunciam situações de abuso de patrões (tais como empresas terceirizadas) e divulgam a proposta organizacional da federação em todas as áreas possíveis.
Nos últimos quinze anos, foram organizados Oficios Vários em diferentes partes do país, mas só conseguimos estabelecê-los em torno da cidade de Buenos Aires e seus subúrbios, sendo mais instável o suporte de grupos em outras regiões do país. Atualmente temos cinco sociedades de resistência, quatro delas de Ofícios Vários (Capital, La Plata, Lomas de Zamora e Zona Norte) e uma especificamente de Trabalhadores da Educação (em Pilar). A inserção sindical dos militantes dos Oficios Vários está localizada principalmente nas áreas de serviços, indústria e educação, e as estratégias de ação variam de acordo com a zona de ação e o sindicato ao qual pertencem. A diferença é encontrada entre aqueles que têm a possibilidade de participar até certo ponto da vida dos sindicatos “representativos”, gerando uma oposição à burocracia que os conduz, e aqueles que não têm a possibilidade de manifestar abertamente sua oposição à direção devido ao caráter mafioso e ganguista que os caracteriza, para o qual os camaradas devem desenvolver táticas “clandestinas” dentro de seus ambientes de trabalho, fora da estrutura sindical.
Neste sentido, o modelo sindical vigente em nosso país torna muito difícil desenvolver uma proposta sindical alternativa, para não dizer libertária. Desde meados do século XX, com o peronismo, foi imposta uma legislação que só permite que um sindicato por ramo de atividade seja legalmente reconhecido para negociar acordos coletivos de trabalho, com base no argumento de que eles teoricamente representam a maioria dos trabalhadores. Os sindicatos “minoritários” podem existir legalmente, mas têm muito menos poder. Este modelo tem sido historicamente denunciado pela FORA, exigindo a livre associação dos trabalhadores a fim de se defenderem dos patrões, mas também do Estado.
Voltando ao presente de nossa organização, nos últimos anos avançamos na resolução de discussões por meio de Plenárias e Reuniões Regionais de Delegados, o que ajudou a fortalecer nossa organização. Ao mesmo tempo, no último período, foram organizados diferentes grupos de trabalho em relação a espaços ou tarefas mais específicas, de modo que um grupo de companheiros aposentados organizou uma comissão dentro do Oficios Vários da Capital para poder se aproximar e reclamar por sua situação particular, já que na Argentina as aposentadorias são uma área onde são feitos frequentes apelos para reduzir os gastos públicos em detrimento das condições de vida dos idosos. Também foram criadas comissões de gênero para trabalhar sobre o problema da opressão patriarcal e seus efeitos no local de trabalho, dentro de um contexto de grande ativismo feminista em nossa sociedade. Por outro lado, foi criado um grupo de estudo sindical com o objetivo de analisar mais de perto as estruturas predominantes, sua legislação e sua permeabilidade, a fim de poder elaborar linhas de ação alternativas. Finalmente, há alguns anos, nossa editora – Ediciones FORA – começou a publicar uma série de livros, dando assim um salto qualitativo em relação aos panfletos habituais até então. Os títulos publicados vão desde a reedição de textos clássicos de militantes foristas como Juana Rouco Buela, Emilio López Arango e Diego Abad de Santillán, junto com alguns mais próximos como Eduardo Colombo, até a produção de um companheiro contemporâneo como Leonardo Eldorriaga.
A perspectiva internacionalista continuou a ser uma preocupação constante para nossa organização, pois desde sua formação estabeleceu como norte a união fraternal de trabalhadores do mundo todo além das fronteiras nacionais. Neste sentido, como vocês sabem, compartilhamos o caminho empreendido pela USI, FAU e a própria CNT, tendo que nos dissociar de uma entidade histórica como a AIT, já que não estava cumprindo as expectativas e objetivos mínimos que um internacional de trabalhadores deveria ter, portanto, assim como nossas organizações irmãs na Europa, esperamos que, com a fundação da CIT, possamos cumprir nossos objetivos.
Saúde e revolução social!
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