Seção de Trabalhadores (as) da Educação do Sindicato Geral Autônomo – SIGA-DF
O ofício docente sempre foi trabalhoso e desvalorizado no Brasil. A idealização do passado, com supostos tempos áureos da educação no país, é baseada apenas em raras exceções. De maneira geral, a situação é pior no setor privado, sem importantes conquistas trabalhistas como as alcançadas pelas trabalhadoras e trabalhadores do setor público. As condições de trabalho, que se deterioram ainda mais com a expansão do ensino superior à distância, a contrarreforma trabalhista, e diversas derrotas da classe trabalhadora em nível local, se tornaram insustentáveis no atual contexto de pandemia.
Pressão extra e corte de direitos
Repentinamente, professoras e professores se viram com a obrigação de improvisar aulas remotas utilizando materiais pessoais que nem sempre são adequados ao uso profissional, como computador e telefone celular; além de ter que reservar espaços de seus domicílios para o uso a trabalho, e arcar com a energia elétrica e internet consumidas a serviço dos empregadores. Houve, ainda, vários casos de docentes que sentiram uma pressão velada para adquirir produtos ou serviços por conta própria a fim de melhorar a “qualidade técnica” destas aulas. A transformação do lar em espaço de produção adoece, induz ao descontrole das horas de trabalho e à falta de um ambiente de paz e acolhimento.
A já elevada carga de trabalho extraclasse e não remunerada se tornou ainda maior, inviabilizando definitivamente a recuperação física e mental, e prejudicando a saúde. Além do tempo consumido e não pago por atividades como preparação de aulas e de materiais, correção de provas e de trabalhos, e atendimentos a estudantes e a familiares. Professoras e professores sem formação e sem experiência específicas neste “novo formato de ensino” passaram a se ocupar com o reajuste de planos, a produção de conteúdo audiovisual, e até mesmo algum suporte técnico sobre plataformas digitais. Conciliando esta carga com os novos protocolos de saúde e higienização domésticos, que demandam tempo e já são tão estressantes.
Todo esse ônus ocorre sem nenhuma contrapartida. A suposta compensação por tamanho esforço – retratado como voluntarioso – se resume apenas à retórica sentimentaloide em mensagens de “reconhecimento” e de “agradecimento”. Um tipo de ação que pode até tocar muitos corações, mas essa bajulação não cobre os gastos que as escolas e as faculdades repassaram a docentes quando ficaram livres de custear a abertura de suas estruturas físicas, nem recupera a saúde física e mental dos docentes. É um empenho de fato voluntário para quem teve a visão de mundo do explorador incutida em si, para quem aprendeu a aceitar ordens sem as questionar, mas obrigatório e cruel para quem identifica o assédio moral e as ameaças de demissão sem poder reagir adequadamente.
A ameaça é mais imperiosa no setor privado, cujos docentes recebem menos pelo trabalho. No setor público, a ameaça velada é voltada sobretudo aos contratos temporários. Mas até os efetivos operam sob pressão com a recomendação do MPDFT, que aconselhou o governo a realizar cortes salarias se não houver teletrabalho. O setor público ainda sofre com o corte de 3% no salário pela reforma da previdência distrital e com o congelamento salarial e progressão funcional até 2022, ambos consequência da aprovação da política de Bolsonaro e Paulo Guedes nacionalmente.
Os estudantes também têm enfrentado dificuldades. Para cumprir a carga horária das aulas, as crianças são expostas a telas luminosas por um tempo muito superior àquele recomendado pelas instituições de saúde. Mesmo assim, a qualidade do processo ensino-aprendizagem é insuficiente devido à ausência de uma supervisão docente presencial, a falta de interação com colegas, problemas com a internet ou aparelho, dentre outros.
Além disso, por variados motivos, mesmo quem estuda em uma escola particular pode não ter um ambiente doméstico adequado para assistir aulas. Tal situação é especialmente frequente no ensino superior, quando alguém trabalha para pagar as próprias mensalidades, e tem acesso a um local de estudo apropriado, livros e internet de qualidade apenas no âmbito da faculdade.
A perspectiva de piora não pode ser descartada, principalmente se o grave quadro epidemiológico do Distrito Federal for visto como impeditivo para uma mobilização consistente. Empresariado, familiares – que querem deixar suas crianças em algum depósito para melhorar o desempenho no trabalho – e docentes – que não sabemos se agem livremente ou sob coação –, se articularam. Calúnias, ataques verbais e virtuais foram direcionados ao sindicato estatal da categoria (SINPROEP-DF) assim que o órgão esboçou alguma oposição ao retorno das aulas presenciais durante o ápice da crise – oposição ainda aquém do necessário, também por parte do SINPRO e SAE na rede pública. A Carreata da Morte, com dezenas de carros circulando pela Esplanada dos Ministérios e pelo Eixo Monumental, buzinando e exibindo cartazes pedindo a reabertura das escolas particulares, ocorreu mais de uma vez.
Não se trata de pessimismo ou visão negativa. Basta analisar criticamente o que o governo Ibaneis e empresários da educação e comércio estão anunciando. Péssima e negativa irá ficar mais nossa vida se docentes e comunidade escolar não se mobilizarem para frear esse desastroso ensino remoto e impedir o retorno presencial e híbrido.
Uma decisão judicial chegou a autorizar o retorno das aulas presenciais nas escolas particulares, mas foi revogada quando veio a público que a juíza responsável tinha envolvimento econômico com o mercado local da educação – inclusive, sendo seu pai conselheiro do sindicato patronal (SINEPE-DF). Ainda assim, tudo indica que representantes da rede privada de ensino insistirão em seu intento. Junto com as falácias econômicas que a burguesia repete em coro desde o início das medidas de distanciamento social, argumentam que têm um protocolo para impedir que as crianças façam contato umas com as outras. Isto justamente no Distrito Federal, que se tornou exemplo de medidas para controle do novo coronavírus que constam em documentos oficiais, mas não são aplicadas na prática.
Os protocolos anunciados são suficientes?
Vemos o DF amargar como uma unidade federativa entre as que mais tem casos de covid-19 por habitante no Brasil. Afirmamos: os protocolos anunciados são insuficientes e sequer dão conta da realidade e possibilidades de infecção nos ambientes escolares.
Mesmo países que adotaram medidas preventivas mais avançadas reportaram surtos escolares de COVID-19 após retorno. Em meio a isso, foi possível observar que trabalhadoras e trabalhadores representam a maioria dos casos de contaminação nas escolas. Ou seja, a massa trabalhadora das escolas particulares, bem como familiares de estudantes da rede pública e trabalhadoras/es terceirizadas/os, que possuem uma condição socioeconômica muito inferior à de quem nelas estuda, poderá constituir mais um desdobramento daquilo que está claro na crise do coronavírus no Brasil: as pessoas mais pobres são as mais afetadas.
Outro aspecto da reabertura das escolas particulares e públicas é que mesmo não sendo o grupo com maior contágio, crianças são infectadas. Além de serem mais frágeis que os adultos, elas são um importante vetor de dissipação do vírus para indivíduos de todas as faixas etárias, inclusive aqueles da terceira idade, que apresentam comorbidades, e que configuram o principal grupo de risco.
É preciso se preparar para agir
O vai e vem do GDF em suspender as aulas presenciais, decretar seu retorno e voltar a adiá-las não nos parece decisões técnicas. Ibaneis já declarou que é de seu interesse reabrir as escolas, assim como reabriu o comércio devido a pressão e aliança que tem com o empresariado. Ibaneis e seus Secretários falam bastante que a vida está em primeiro lugar, mas por que não fizeram a interrupção nas atividades do comércio após o crescimento de infecções e mortes devido a sua reabertura? Os compromissos com o lucro e com o produtivismo estão acima da vida. Nos parece que se não fosse alguma pressão das categorias docentes e famílias, as escolas já estariam todas abertas.
Mas essa pressão deve continuar e aumentar. E deve também questionar o modelo de “educação remota”, cuja carga de trabalho é ampliada e faltam condições para um ensino e aprendizagem satisfatório, além de adoecedor. Na rede privada, o ensino infantil e fundamental 1 continuam com data para o retorno presencial, colocando a saúde e vida dos profissionais, familiares e comunidade em risco. É preciso organizar trabalhadoras e trabalhadores da educação, estudantes e seus familiares para um vigoroso boicote! A aprendizagem pode ser recuperada, uma vida jamais.
Enquanto durar a pandemia, não é hora de retornar. É preciso que a comunidade escolar rompa o silêncio e organize campanhas e ações para pressionar o GDF e as escolas privadas contra o retorno presencial e híbrido. Protestos, greve e boicote pela vida!
Leia também: Não retornar às aulas presenciais: Boicote e Greve pela Vida!
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