Por uma Federação Autônoma de estudantes da UNB

por Organização Estudantil CCI – Combativa, Classista e Independente da UnB (filiada à RECC/FOB)

Ano XI, Edição nº 48 – Agosto de 2018   [BAIXE EM PDF – formato livreto] 

POR UMA FEDERAÇÃO AUTÔNOMA DE ESTUDANTES DA UNB

Acumular as experiências de lutas combativas para combater o neoliberalismo e defender os direitos do povo

“Ainda que nos prendam, ainda que nos matem, mesmo assim voltaremos e seremos milhões.” Honestino Guimarães

Começamos o ano com a construção de uma importante jornada de lutas na UnB. As lutas articularam estudantes e trabalhadores, levaram para a rua e para o enfrentamento as demandas da comunidade, ocorreram ocupações (FNDE e Reitoria), greves, piquetes, panfletagem, barricadas, passagem em sala, sabotagem, colagem de cartazes, assembleias, reuniões executivas, autodefesa, etc. A experiência e conhecimento coletivo alcançado nessas jornadas de lutas supera meses ou anos de conhecimento puramente teórico, advindo de panfletos e discursos. No entanto, muitos desafios aindase colocam para os estudantes do povo. Não podemos ter uma análise derrotista nem triunfalista para agradar esse ou aquele interesse (ou o nosso próprio ego), devemos ter uma análise correta e verdadeira.

Nesse texto nós pretendemos analisar alguns elementos do avanço do neoliberalismo na educação, a onda de ocupações em 2016, as últimas eleições do DCE, essa importante e recente jornada de lutas em 2018, bem como e apontar algumas tarefas que consideramos necessárias para a reorganização do movimento estudantil classista e combativo da UnB e do DF, em especial a construção de uma Federação Autônoma de Estudantes da UnB. Para tal objetivo é fundamental realizar não apenas uma crítica aos setores oportunistas de esquerda e de direita, mas também realizar uma autocrítica sobre a atuação dos setores combativos e independentes, no qual nos incluímos.

Breve balanço do neoliberalismo na educação e na UnB

A educação brasileira sofreu duras derrotas nos últimos anos, e a tendência desde o golpe parlamentar é o aprofundamento dos retrocessos de uma forma brutal. Mas os profundos retrocessos que falamos não podem ser datados apenas a partir do impeachment de Dilma. A macropolítica educacional dos governos Lula-Dilma (PT-PCdoB-PMDB) foi baseada desde o seu princípio a partir das orientações do Banco Mundial. O que vimos na última década foi um processo profundo de privatização da educação superior através do aumento das faculdades e cursos técnicos privados por meio do Prouni, Pronatec, FIES, o que levou a uma proliferação de faculdades de baixa qualidade descomprometidas com a pesquisa e extensão (as famosas fábricas de diploma), endividamento e abandono estudantil; da privatização interna das universidades públicas através das fundações privadas e das terceirizações, de cursos pagos, etc.; precarização das condições de estudo e trabalho com o aumento exponencial de cursos ultra-precarizados e tecnicistas, cursos à distância sem qualidade, problemas recorrentes na Assistência Estudantil, corte de verbas; o fortalecimento do discurso neoliberal de “gerenciamento de recursos escassos” pelas reitorias de direita ou de “esquerda”, colocando o problema da educação meramente como um problema de “gestão eficiente”; criação do Enem que também ampliou o ranqueamento nacional, colocando os “melhores estudantes” nas “melhores universidades” (com mais verbas) não alterando a lógica elitista do vestibular.

De fato, devemos reconhecer, durante os governos do PT houve um aumento das matrículas nos cursos técnicos e superiores (principalmente do setor privado), e é em cima disso que se ampara todo o discurso marqueteiro dos partidos reformistas (PT, PCdoB) e suas entidades estudantis (UNE,UBES[1]). Porém, esses assumem um discurso quantitativista e formal (número de matrículas, etc.) que despolitiza as contradições criadas e acima citadas, ou seja, o processo de privatização e precarização da educação e condições de vida.Por isso não compreendem porque a base social que foi “beneficiada” por esses programas não tenha virado mecanicamente base de apoio dos seus governos ou de seu discurso oportunista. O mesmo ocorre em relação ao mercado de trabalho, tendo em vista que a maior parte dos empregos criados nas últimas décadas são empregos precários (vide o aumento gigantesco da terceirização).

Tal como esperado, as políticas neoliberais entraram em alta velocidade depois do golpe parlamentar. Em pouco menos de 2 anos o governo Temer (PMDB-PSDB) já aprovou diversas medidas que atacam profundamente a educação e os direitos da classe trabalhadora. Primeiramente devemos citar a aprovação da “PEC da Morte” (hoje Emenda Constitucional 95) que congela por 20 anos os investimentos em áreas sociais (educação, saúde, seguridade social, etc.) e seus efeitos já são sentidos nas instituições federais de ensino, e que anuncia para os próximos anos a tendência de uma profunda precarização e privatização que atingirá tudo e todos. Diretamente relacionada estão a “Reforma do Ensino Médio” e a “Base Nacional Comum Curricular” aprovadas durante o governo Temer (mas que já era uma política prevista no documento “Pátria Educadora” do governo Dilma/PT). Ambas as políticas aprofundam a precarização das condições de estudo (retirando a obrigatoriedade de diversas matérias e conhecimentos); afetando as licenciaturas das universidades; estabelecendo parcerias com instituições de ensino à distância “com notório reconhecimento” para complementar a grade curricular; aprofundando o tecnicismo e a formação de mão-de-obra barata para o mercado (orientando as escolas para parcerias com cursos técnicos privados); aprofundando o autoritarismo através da avaliação e punição das escolas, estudantes e servidores que não alcançarem índices governamentais; perda das especificidades regionais. Somado a essa situação ainda tivemos a aprovação da Reforma Trabalhista que aprofundará a superexploração da classe trabalhadora nos próximos anos.

Todas essas políticas têm impactos sociais profundos na vida do povo e dos estudantes. Os impactos se fazem sentir nas ações das Reitorias, empresas ou governos estaduais, municipais ou distrital. Na UnB a reitoria de Marcia Abrahão/PT cumpre o papel de aplicar e gerenciar a política neoliberal do governo Temer e do MEC. No entanto, nenhuma dessas políticas das classes dominantes e exploradoras tem sido aceita pacificamente pela classe trabalhadora. Um novo ciclo da luta de classes se abriu em junho de 2013, e é necessário compreender as recentes lutas populares e o lugar do movimento estudantil da UnB.

As ocupações de escolas e universidades em 2016: ação direta-federalismo X reformismo-burocratismo

Nos últimos anos aconteceram lutas nacionais que mobilizaram milhares de estudantes. Essas lutas fazem parte de um processo histórico e de experiência coletiva do povo brasileiro. Elas não podem ser pensadas como coisas separadas. Podemos citar alguns fatos: A revolta popular por direitos coletivos em junho de 2013; as greves insurgentes (garis do RJ em 2014, rodoviários em 2014, nas obras no PAC, etc.); as ocupações de escolas em São Paulo em 2015 contra a “reorganização” de Alckmin (PSDB); as ocupações de escolas e universidades no Brasil em 2016 contra a Reforma do Ensino Médio(MP 746) e a PEC da Morte (EC 95);as paralisações nacionaise o “Ocupa Brasília” em 2017. Obviamente, frente a esse processo se levantaram as forças reacionárias (políticas, econômicas, religiosas, militares) e as forças do reformismo e das burocracias sindicais e partidárias.

No ano de 2016 a UnB e várias escolas do DF se juntaram às ocupações que atingiram mais de mil escolas e centenas de universidades no Brasil contra a Reforma do Ensino Médio e a PEC da morte. Em outubro, alguns dias depois das primeiras escolas serem ocupadas, a UnB teve diversos prédios ocupados (incluindo a Reitoria) por cerca de 45 dias. Além disso, dezenas de escolas e institutos federais foram ocupados em Planaltina, Samambaia, Gama, São Sebastião, Plano Piloto, e outros bairros periféricos. Apesar de não ter barrado tais medidas as ocupações foram processos de resistências fundamentais contra o governo Temer (PMDB), governos locais e também contra direções escolares e universitárias. Muitas escolas no Brasil conquistaram reivindicações locais relativas à estrutura, democracia, etc. Geraram uma importante experiência de mobilização que atingiu centenas de milhares de estudantes. Demonstraram a força da ação direta em contraste com as práticas oportunistas e eleitoreiras da UNE e UBES.

Em meio àocupação, a UnB empossou a nova reitoria de Marcia Abraão, apoiada pelo PT, PCdoB, PSOL, PCB, UNE, CUT, após 4 anos de uma reitoria diretamente vinculadas à direita. Um discurso esquerdista e anti-golpista difuso retomou força e hegemonia em diversos setores da universidade. Durante as ocupações o DCE ainda permanecia dirigido pela direita, mas mostrava claro desgaste e apatia, fruto de rachas e disputas internas no campo da direita e extrema-direita universitária (tal como o grupo Aliança pela Liberdade, financiado e apoiado por institutos norte-americanos).

As ocupações da UnB e do DF ocorreram nesse contexto. Porém, “nem tudo são flores”, a realidade atual do movimento estudantil demonstra isso. É necessário repensar esses processos de luta:

Primeiro, as ocupações começaram com as escolas e tiveram realidades muito diferentes entre si e entre estas e a UnB. Isso dependeu muito das direções escolares, do apoio de professores, da mobilização dos próprios estudantes. Tiveram escolas que ficaram até duas semanas ocupadas enquanto outras ficaram três dias. Mas uma coisa é certa, a repressão que se abateu sobre as escolas públicas, de certa maneira, foi semelhante ao que ocorreu na UnB, tendo em comum os ataques sumários de estudantes contrários à ocupação apoiado pela direita organizada e variados tipos de pressões por parte do aparato repressivo estatal. O governo Rollemberg (PSB) foi responsável por uma política autoritária e militarista contra os estudantes do povo. Quem não lembra da ação do TJDF (30/10) que autorizou uso de técnicas de tortura contra as ocupações? Tais como: cortes do fornecimento de água, luz e gás das escolas, uso de ruídos para impedir o período de sono e restrição ao acesso de familiares, amigos e alimentos.

Segundo, cabe ressaltar que de forma geral as ocupações tentaram ser dirigidas pela UNE e UBES e sua política pelega e burocrática, como forma de abafar o movimento. Porém sofreram várias derrotas em suas propostas que foram substituídas pela vontade da base em que ocorresse uma junção das pautas locais de cada departamento com a pauta política nacional, garantias mínimas de prosseguimento de uma comissão co-responsável pelo próximo edital da assistência, bem como a não criminalização do movimento.

Terceiro, essa disputa política nas ocupações da UnB levou, em alguns departamentos a uma prática de exposição midiática eleitoreira e uma tentativa de organização altamente centralizadora, restringindo alimentos e verbas inclusive, tentou inferiorizar diversas ocupações de prédios e departamentos com o discurso de que o foco político seria no prédio da Reitoria, onde estavam em maioria os burocratas, incluindo a presidente da UNE. Com essa linha o PT e PCdoB buscavam se promover em escala nacional, e ao mesmo tempo não entrar em conflito com a sua reitora recente eleita. No caso das ocupações secundaristas prevaleceu o infeliz isolamento das escolas pela falta de experiência e pela disputa mesquinha entre siglas igualmente oportunistas como Juntos (PSOL), UJS (PCdoB) e JR (PT). Tal isolamento tornou-as alvos fáceis da repressão estatal (e paraestatal dos “desocupas”) que se abateu sobre grande parte delas.

Quarto,o esvaziamento se deu principalmente pelo descredito jogado para a luta de base e por superestimarem a luta institucional via DCE(Todas as vozes) e reitoria (Marcia Abraão),bem como as acusações e ataques da direita, chegando até agredir e roubar carro dos ocupantes, assim como a própria pressão da reitoria Ivan Camargo e da chapa vencedora dialogo pra avançar.

A honestidade, coragem e força de vontade de muitos estudantes que participaram das ocupações não foi suficiente para impedir a hegemonia política dos pelegos e oportunistas, nem vencer a repressão estatal e o circo midiático. Faltou um claro e reconhecido programa classista e combativo de reivindicações, táticas de luta e propostas de organização que condissessem aos anseios de autonomia, autogestão, ação direta, federalismo. Faltou a compreensão de que para defender esses princípios era necessário combater politicamente, de forma organizada e unificada, os oportunistas e os reacionários e apresentar uma alternativa.Dito isto faltou um organismo estudantil forte coeso e consolidado que pudesse apontar o trajeto até a vitória das reivindicações, capaz de se tornar uma alternativa a política vacilante dos reformistas.

A eleição do DCE em 2017: o burocratismo da direta e da esquerda

Como dito anteriormente, a esquerda oportunista da UnB tratou de direcionar a ocupação dos estudantes para a disputa de cargos no DCE. Para isso fizeram um chapão, muito bem chamado “Todas as Vozes” (sic), e que reuniu PT, PCdoB, PSOL, MAIS, LPJ e o PSB (este último no governo neoliberal e repressor de Rollemberg). Foi com essa composição política que a “esquerda” venceu as eleições do DCE no dia 07/04/2017, depois de 5 anos de gestões de direita.

As organizações oportunistas de esquerda e de direita transformaram as eleições do DCE da UnB num processo altamente valorizado, fazendo com que muitas vezes se perdesse o real significado da entidade estudantil para além da conquista dos cargos. Essa é a velha prática do parlamentarismo estudantil, assumido abertamente pela direita (defendido literalmente pela “Aliança”), mas também praticado de forma velada pela esquerda oportunista (UNE, PT, UJS, PSOL, PSTU).

Isso fica claro quando vemos que a chapa “Todas as Vozes” chegou a ter mais de 400 membros inscritos na chapa, e a segunda colocada “Aliança pela Liberdade” também tinha centenas de membros. Durante as gestões da direita os espaços do ME foram completamente esvaziados e sabotados. Até o final de 2017, quase um ano da gestão “Todas as Vozes”, praticamente nenhuma assembleia geral, debate ou mobilização coletiva foi organizada, não refletindo a quantidade de pessoas na chapa, muito menos as necessidades urgentes de mobilização frente a tantos ataques à UnB. E na atual jornada de lutas o DCE tomou uma postura altamente legalista, passiva, enfim, oficial-burocrática. Mas isso é um problema que se encontra na raiz do parlamentarismo estudantil: querem fazer o movimento estudantil “à imagem e semelhança” do Parlamento burguês, um espaço meramente “representativo”, esvaziado de luta e reivindicações, sendo os diretores do DCE treinados como futuros candidatos-mirins para a farsa eleitoral.

Além disso, soma-se o contexto local, onde o DCE (chapa Todas as vozes) era aliado direto da Reitoria. Tendo a gestão da “Todas as vozes” chegada ao fim, presenciamos uma nova eleição para o DCE, levantaram-se varias chapas tanto da esquerda oportunista quanto da direita evidenciando justamente o que a anos denunciamos: O oportunismo dos partidos e coletivos que constroem a UNE e a sanha destes em ocupar a burocracia universitária atravancando a luta. Ora, todas as chapas se ausentaram de construir efetivamente a jornada de luta que se deu no semestre 1º/2018, suas falas, posturas e denuncias da situação drástica da UnB não se transformaram em apoio real aos diversos estudantes em luta e suas ações para combater a crise passaram antes de tudo pela disputa do DCE, mesmo que em assembleia geral dos estudantes tenha se decidido adiar tais eleições. Durante o período de votação ocorreram ações fortalecendo a campanha “não vote, se organize e lute” que acertadamente cumpriu o papel de denunciar os reais interesses das chapas e oferecer uma alternativa convidando a estudantada a boicotar as eleições e a se organizarem para lutar. No fim do pleito, a “Aliança pela liberdade” aquela galera financiada pelos “Students for Liberty” retomou a gestão do DCE da UnB e assim como nos 5 anos em que esteve a frente de tal entidade pretende, seguir sua politica de higienização e imobilismo.

O pós-modernismo e a histeria virtual como forma de (pequena) política: reflexões sobre a “ressaca” das lutas

O que se tem percebido é que, por falta de um programa classista e combativo coerente e coeso bem como uma alternativa de organização permanente, em momentos posteriores aos auges da luta, a tendência de muitos, inclusive os “independentes” tem sido a dispersão e, no pior dos casos, a pequena-política. Tal fato ocorreu no pós-junho de 2013 e no pós-ocupações de 2016.

Essa pequena política toma a forma difusa através de uma série de “polêmicas” nas redes sociais, que em geral possuem pouca ou nenhuma relevância para a vida dos estudantes e do povo trabalhador. Muitos factoides virtuais e curiosidades sobre famosos, especialmente apresentados nos formatos de memes, denúncias ou afirmações “lacradoras” pseudo-esquerdistas recebem grande audiência, enquanto temas e ações de grande relevância para a defesa e avanço das lutas muitas vezes são ignorados. Esse tipo de atitude é típico de pessoas que no auge da luta surfam na indignação e construção alheia, mas basta a luta se tornar mais difícil, surgirem as polêmicas de “fim de greve/ocupação”, o trabalho de base se apresentar mais cansativo, essas pessoas se recolhem no seu individualismo e apatia, e atrás das redes sociais podem manter uma postura “super pura” e “problematizadora”, mas não estarão dispostos a moverem uma palha para organizar os seus iguais para se levantar e enfrentar uma autoridade real na sociedade (patrão, polícia, reitor, político, etc.). A luta para esses vira um “desabafo”, um “descarrego”, tão passageiro quanto irresponsável, e nas redes sociais garantem sua “fama”. Isso vale tanto para a baixa qualidade das “críticas” feitas à esquerda oportunista, mas principalmente aos setores autônomos, sem poder institucional-estatal.

A isso vem acompanhado também o pós-modernismo, individualismo, as ultra-fragmentações e a vivência/pertencimento como verdade absoluta. A vivência e a experiência quando tomadas de forma relativa e dialética (ou seja, numa relação entre ideia-ação, teoria-prática, indivíduo-coletivo) são verdadeiras e a base de tudo, mas tomadas como verdade absoluta (ainda mais quando usada para inferir “verdades” que dizem respeito à coletividades a partir de vivências individuais) se tornam enganosas e uma grande armadilha. E tornam-se absolutamente oportunistas se utilizadas como elementos disciplinadores e argumentos de autoridade inquestionáveis, só sacados da manga quando se quer destruir a dissidência e o discordante. Aqueles que querem realmente reorganizar o movimento estudantil classista e combativo devem se afastar desse tipo de conduta e de pessoas sem compromisso ou moral. Diferente dessa conduta, o nosso “ato de destruir deve ser construtivo”, devemos combater os inimigos do povo, disputar com os “adversários” nos espaços do movimento, mas devemos sempre ter compromisso em levar propostas e resoluções para as massas estudantis e populares.

Hoje nós temos uma realidade social na universidade bem diferente de 10 anos atrás. Isso não signifique que esteja melhor. É uma realidade cheia de contradições, algumas delas gritantes, o que torna a universidade um barril de pólvora. O ponto principal é a política de cotas, para negros e para escolas públicas, por onde ingressaram muitos estudantes pobres (a maioria não conseguiu, pois o vestibular ainda está de pé). O fato é que a problemática das condições de estudo afeta um número cada vez maior de estudantes. Existe uma demanda reprimida e que tende a aumentar nos próximos anos relativa à: condições das bolsas (assistência, científica); casa do estudante; transporte público; restaurante universitário; hospital universitário; etc. Ou seja, demandas coletivas que dizem respeito à carestia, precarização e privatização de serviços. Além disso, existem lutas reivindicativas estratégicas como: creches públicas, questões curriculares, contra a polícia no campus, em defesa dos terceirizados, etc. Para todos esses problemas existem soluções e resistências “individuais” e em pequenos círculos sociais (familiares, de amigos, igrejas, etc.), mas o que o movimento estudantil e o sindicalismo revolucionário tem a propor sobre isso? Nós devemos estar totalmente voltados para essa nova realidade, saber que estamos inseridos nela, e saber que formular e disputar formas de resistências coletivas é preparar alternativas de sobrevivência para nós mesmos. Essa é a Grande Política da qual o movimento estudantil classista e combativo deve despender seus esforços políticos e militantes.

A jornada de luta contra as demissões e contra o corte orçamentário

Desde o mês de março de 2018 começou uma jornada de lutas na UnB. Frente ao processo em curso por parte da Reitoria de demissão em massa de mais de 500terceirizados e 1.100 estagiários, bem como o aumento do Restaurante Universitário de 2,50 para 5,20 (e 13 reais para terceirizados e comunidade externa), a diminuição das bolsas de assistência estudantil, dentre outra medidas de aplicação do corte orçamentário (EC 95) dentro da UnB, uma série de ações foram desenvolvidas por estudantes e trabalhadores a fim de impedir tais retrocessos. Um elemento fundamental a ser ressaltado é que o DCE, que havia passado o ano de 2017 praticamente parado, ainda permanecia alheio ao processo de mobilização e luta. Portanto, inicialmente quem teve o mérito da iniciativa foi a mobilização independente e combativa dos estudantes, contando com a Comissão de Estudantes e Trabalhadores/as Terceirizados/as, grupo autônomo que se formou na luta contra as demissões de terceirizados em 2017. Além disso, a iniciativa dos terceirizados de fazer um abaixo assinado reuniu milhares de assinaturas e conquistou rapidamente o apoio da comunidade universitária. O SINTFUB foi praticamente arrastado pela base para participar.

A mobilização e a conscientização foram crescendo, especialmente entre os terceirizados e os estudantes. No dia 26 de março os terceirizados da limpeza fizeram uma paralisação e saíram em uma grande marcha com mais de mil manifestantes pela universidade em direção à Reitoria.

O dia 10/04 amanheceu com a maioria dos prédios da UnB fechados. Piquetes foram levantados por estudantes e trabalhadores nas principais entradas, contaram com grande apoio e adesão da comunidade. As 10h começou o Ato Unificado, saindo do museu nacional em direção ao MEC. Cerca de 2 mil pessoas aderiram ao ato. Chegando aos ministérios as entradas estavam cercadas de policiais militares. Se colocando a frente das entradas um grupo de manifestantes foi atacado brutalmente pela polícia com cassetetes, chutes e spray de pimenta. Prontamente os presentes reagiram de forma justa e legítima à agressão e violência policial. A resistência popular foi criminalizada pelos burocratas sindicais e estudantis da CUT e UNE, momento em que fizeram um “cordão humano” para proteger a polícia e o prédio do MEC e depois agrediram uma companheira independente chegando a tentar derrubá-la do carro de som. Após a repressão na frente do MEC, trabalhadores e estudantes ocuparam o prédio do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), e só saíram com a promessa do MEC de uma “audiência pública”.

Após isso, no dia 12/04, uma Assembleia de Estudantes foi convocada por um grupo formado no calor do dia 10/04 chamado “Comissão Popular UnB”. Essa assembleia teve adesão expressiva de estudantes que após a realização da mesma decidiram ocupar a Reitoria. Todos os partidos reformistas abandonaram a ocupação, cuja a qual desde seu inicio serviu como polo ativo de luta pressionando e forçando a Reitora a negociar, e de mobilização do estudantado realizando variadas atividades desde panfletagem a intervenções na rotina da UnB. No dia 26/04 aconteceu o 2º Grande Ato em defesa da educação pública. Os manifestantes mais uma vez marcharam rumo ao Ministério da Educação (MEC), chegando ao prédio a tropa de choque e a cavalaria já estavam posicionados e em pouco tempo iniciaram uma brutal repressão com muitas bombas, espancamentos, prisões e perseguição. A repressão se estendeu com a invasão do campus pela PM, reprimindo, intimidando e revistando os estudantes e trabalhadores. Alguns estudantes foram agredidas/os, presas/os e levadas/os para a 5ª DP.Após a avalanche de repressão, ataques da pelegagem e da direita e devido ao próprio esvaziamento, a ocupa teve seu desfecho com a repressão onde a reitoria obrigou perante liminar a desocupação do prédio.

Importante apontar o papel de destaque das minas em todos esses enfrentamentos e a resiliência destas, que mesmo nadando contra a maré, contra ataques de fora e dentro do próprio movimento, se colocaram como exemplo de resistência e persistência e apontaram para a auto-organização dos estudantes como solução para crise.

Construir uma Federação Autônoma de Estudantes da UnB como passo estratégico na reorganização do movimento estudantil

Obviamente nenhum programa ou estratégia, por melhores que sejam, existe no vazio. Nesse sentido, essa militância que tem se formado em torno da resistência imediata é a base para a construção de uma proposta de programa e estratégia autônoma e combativa. Essa resistência imediata pode caminhar para dois caminhos: 1) Agir conforme a conjuntura e atuar “apagando incêndios”, ou seja, ser guiada pelo pragmatismo, levando muitas vezes a sua desestruturação em tempos mais “mornos” e levando a sua desestruturação definitiva no médio-longo prazo; 2) Aderir à linha estratégica e programática do sindicalismo revolucionário que potencialize e unifique os grupos e organizações autônomas, classista e combativas, mantendo suas especificidades mas rompendo com o isolamento e o pragmatismo caminhando rumo a construção de uma Federação Estudantil.

Em grande medida o movimento soube encarar de forma prática os problemas urgentes colocados pelo contexto nacional (corte de gastos na educação, aumento da repressão, reforma trabalhista, etc.) e local (aumento do preço do RU, demissão de terceirizados e estagiários, etc.), para resistir e defender os direitos. No entanto, essa necessidade imediata não pode cair num imediatismo e pragmatismo, tendências que impedem um aprofundamento teórico e político, tornando-nos cegos para as raízes e as consequências das nossas ações. É necessária uma ação consciente, que articule o debate e o aprofundamento político com a luta cotidiana e o trabalho de base. Por outro lado academicismo e o pragmatismo presentes no movimento estudantil são dois lados da mesma moeda, e o seu resultado é o fortalecimento do reacionarismo e da direita.

É importante falar brevemente que nos últimos 10 anos a CCI atuou em diversos cursos, Centros Acadêmicos, participando ativamente de lutas, greves, assembleias, ocupações, e buscando acumular sempre, através de análises expostas em boletins (O Germinal), teses e cartilhas, essa experiência coletiva de luta. Em muitos momentos fomos atacados pelos oportunistas, mas seguimos firmes, e podemos dizer humildemente que (com erros e acertos) a CCI possui uma contribuição importante e coerente para um novo movimento estudantil, e sua missão de unificar os setores combativos sob um mesmo programa e estratégia segue sendo mais importante do que nunca.

A discussão sobre a construção de “federações autônomas” já vem se dando dentro da Rede Estudantil Classista e Combativa (RECC, organização nacional da qual a CCI faz parte) desde as ocupações de escolas de 2015. Além disso, através da Federação das Organizações Sindicalistas Revolucionárias do Brasil (FOB) o debate sobre “federações autônomas” se expandiu para os âmbitos sindical e popular. Dito dessa forma, portanto, a proposta de uma Federação Autônoma não aparece apenas como uma iniciativa isolada, ocasional, mas parte de um processo mais amplo de reorganização da classe trabalhadora brasileira.

A ideia de Federação desde uma concepção sindicalista revolucionária significa que a organização dos estudantes deve funcionar de “baixo para cima”, onde as decisões devem ser tomadas nas bases, nas assembleias dos cursos, dos campis e das escolas. Em cada uma dessas localidades devem funcionar comitês de mobilização, por curso ou geral da universidade, que terão por missão organizar as assembleias e tocar suas deliberações. Porém a Federação articula essa descentralização do poder numa unidade organizativa que possui princípios, programa e estrutura comum, o que caracteriza nossa proposta de Federação Autônoma Estudantil.

Nesse sentido a federação deve estar calcada em princípios como ação direta, classismo, autonomia e democracia de base. Seu programa deve combater as politicas neoliberais para educação, hoje expressas pelo governo Temer (MDB) e lutar por uma universidade popular. Deve estar estruturada a partir das assembleias de base, dos comitês e das plenárias de delegados dos comitês.

A construção da Federação deve ser feita em contraposição a atual estrutura do DCE, que se encontram burocratizadas e afastadas das lutas dos estudantes. O que não significa que não devamos participar ou mesmo pressionar as assembleias organizadas pelo DCE. A construção da Federação não pode estar subordinada aos mecanismos oficiais e depender destes, deve depender única e exclusivamente da mobilização da base. Mas para que a federação estudantil autônoma se materialize se faz necessário gerar um acúmulo quantitativo e organizativo, através de polos/comitês/frentes/ciclos de mobilizações que aglutinem em espaços fora da institucionalidade aqueles mais dispostos. Por princípio são estruturas abertas a todos os estudantes, independente de posições ideológicas, se organizando por local de estudo com objetivo de iniciar uma organização por fora da burocracia educacional atrelada ao Estado. Esse passo inicial é fundamental para agregar estudantes e dar força à federação estudantil que virá através da articulação entre estes ciclos de mobilização.

A perspectiva estratégica deve ser a construção de uma entidade autônoma de estudantes da UnB. Essa estratégia passa pela construção de novos polos/centros/ciclos/frente de mobilização e o fortalecimento de espaços já existentes em nossos campus como, por exemplo: Frente combativa UnB-Darcy Ribeiro; Fogo no Pavio-FUP, coletivo Turistação (no curso de Turismo), a Comissão de estudantes e trabalhadores terceirizados da UnB. Tais frentes/centros/polos/ciclos devem se ramificar pelos cursos e campi da UnB com comitês por curso, na medida das condições e levantarem uma plenária unificada visando a consolidação da federação estudantil da UnB. Os comitês de mobilização por curso e o comitê de mobilização geral devem construir a médio prazoem uma “Federação Estudantil Autônoma da UnB”, transformando os comitês de mobilização em “comitês estudantis autônomos”. Na medida do sucesso do trabalho com secundaristas e outros setores estudantis a federação pode ampliar sua área de atuação.

LUTAR PRA ORGANIZAR! ORGANIZAR PARA LUTAR!

EM DEFESA DA UNIVERSIDADE POPULAR! NÃO AO DESMONTE DA UNIVERSIDADE PÚBLICA!

CONSTRUIR A FEDERAÇÃO AUTÔNOMA DE ESTUDANTES!

É BARRICADA, GREVE GERAL, AÇÃO DIRETA É O QUE DERRUBA O CAPITAL!

[1] UNE: União Nacional dos Estudantes. UBES: União Brasileira dos Estudantes Secundarista. São entidades burocráticas dirigidas a décadas pela UJS juventude do PC do B, correntes do PT (como CNB, EPS, DS, JR – OT) , e ultimamente em aliança com o Levante Popular da Juventude LPJ, PSB e PDT . Participam como “oposição” oportunistaos grupos: CST e PSOL, UJC/PCB, PCR.

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