Terceirização da terceirização: Os atendimentos domiciliares e a precarização do trabalho na área da saúde

Pró-núcleo de trabalhadoras/es da saúde do Sindicato Geral Autônomo (SIGA-DF)

A terceirização na saúde, tanto nas unidades de atendimento privado quanto nas unidades públicas vem aumentando ano após ano. Os hospitais privados já não se ocupam nem de contratar diretamente as/os profissionais, relegam isso à empresas terceirizadas. Na saúde pública o caminho que os governos tem apontado seguem exatamente na mesma direção. Esse processo, que chega com mais força agora nos centros de saúde, já é uma realidade na prestação de diversos outros serviços, em especial o Home Care.   

O “Home Care”, ou tratamento domiciliar,  é uma modalidade de serviço destinado a pacientes que se encontram acamados, mas que não tem a necessidade de estar dentro de uma UTI. Nele são ofertadas diversos serviços da área da Saúde como a Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Medicina, Nutrição, Enfermagem, entre outras especialidades. A ideia é muito interessante, pois esses pacientes que não possuem necessidade de estar num ambiente hospitalar podem estar em casa, próximo de seus familiares, com um atendimento igual ao oferecido dentro do hospital e sem o risco de contrair uma infecção.

O grande problema do Home Care é que eles acabam trazendo as/os profissionais mais uma vez para informalidade, precarizam a relação de trabalho e aumentam a informalidade das/os trabalhadoras/es da saúde, além de ser um serviço destinado a quem pode pagar. A lógica do Home Care funciona da seguinte maneira: 1) as/os pacientes contratam um plano de saúde; 2) esses planos contratam empresas terceirizadas para fazer a administração das/os profissionais que irão trabalhar nos domicílios das/os pacientes; 3) essa empresa terceirizada por sua vez “quarteiriza” outras empresas, uma de cada área da saúde (uma só de fisioterapeuta, outra apenas com técnico de enfermagem, outra com enfermeiras/os, etc) para disponibilizar as/os profissionais.

Para melhor entendimento da lógica dos atendimentos domiciliares é interessante pensarmos em uma espécie de pirâmide em que no topo ficam os planos de saúde, logo abaixo vem uma grande empresa que irá administrar as empresas menores responsáveis por cada área, e por fim, na base dessa pirâmide, ficam as/os profissionais “autônomos”, ou melhor dizer as/os profissionais precarizadas/os (sem carteira assinada, sem direito a férias, 13º salário, ou seja, sem nenhum direito trabalhista assegurado) .

Na contratação dessas/es profissionais, tudo é feito de uma maneira muito informal. Não existe contrato, não existe folha de pagamento, todas as decisões das empresas responsáveis são feitas em grupos de Whatsapp. Essa informalidade garante o funcionamento dessas empresas, que repassam uma ínfima quantia às/aos profissionais que estão no dia a dia cuidando da saúde dos paciente. Os salários são bem muito abaixo do que os conselhos recomendam. Para se ter uma ideia, no caso do Fisioterapeutas, em média eles pagam R$25 por uma sessão de 40min. Cabe lembrar que o deslocamento do profissional para a casa do paciente é feito com seu próprio carro, ou transporte público, ou uber, o plano de saúde e/ou nenhuma das empresas dão auxílio gasolina ou passagem para as/os profissionais.

Por outro lado, a informalidade é apenas no que concerne aos direitos das/os trabalhadores, as exigências das empresas para com essas/es profissionais são muitas. Folha de ponto na casa das/os pacientes, exigência do cumprimento rigoroso do horário/tempo da consulta (com ameaça de desconto do valor proporcional dos minutos saídos mais cedo, ou até invalidando o atendimento como um todo), rigidez na entrega das fichas de evolução, etc. 

O resultado, além da insatisfação com o trabalho, é, muitas vezes, um atendimento  de pior qualidade. Afinal, para alcançar um salário que minimamente cubra as necessidades as/os trabalhadores tem que atender uma grande quantidade de pacientes. Tem o stress do deslocamento individualizado no trabalhador e  para fechar todo o quadro, obviamente as empresas não pagam as/os profissionais na data correta. Constantes atrasos salariais também fazem parte da rotina.

Durante os atendimentos, as/os profissionais se sentem vigiadas/os, sendo obrigados a colocar um cronômetro durante a sessão para comprovar que foi cumprido todo tempo exigido, e que a família e a/o paciente não se sintam lesados. As evoluções, descrição dos procedimentos realizados, devem ser feitos na casa da/o paciente com todos os possíveis dados sobre sinais vitais, situação que se encontra a/o paciente, terapia desenvolvida e possíveis intercorrências.

No caso especificamente da Fisioterapia em Brasília, não existe nenhum um sindicato oficial ativo que possa atuar nesse caso e vários outros abusos constantes que ocorrem diariamente. Mas, mesmo que tivesse ativo, o SINFITO (Sindicato dos Fisioterapeutas e Terapeutas Ocupacionais) nunca se pronunciou contra essa “quarteirização” que precariza o trabalho das/os profissionais da saúde, que precariza o atendimento das/os pacientes.

Já passou da hora de nós, trabalhadoras/es da saúde, nos unirmos para reivindicar nossos direitos. Não podemos mais esperar cair uma solução do céu, muito menos esperar a boa vontade de patrões e do sindicato oficial, precisamos arregaçar o jaleco e nos auto-organizarmos. Para isso é importante que nós construamos uma associação trabalhista onde tenhamos a voz e o poder de decidir e agir em relação ao que é melhor para nós e para a saúde daqueles que nós atendemos. É dessa forma que convocamos todas/os as/os trabalhadoras/es da saúde a construir o Sindicato Geral Autônomo (SIGA), um sindicato que surgiu no início de 2019 com o objetivo de auto-organização e ação direta, sem vínculos com partidos, burocracias sindicais ou empresas, que busca ser um meio de ajuda mútua entre trabalhadores e de luta por nossos direitos. Venha construir o Núcleo de Trabalhadoras/es da Saúde do SIGA!

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